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Abraço o arco-íris com o olhar visível.

A separação das componentes do espetro da luz solar, ao atravessarem as gotas de água, imprime na minha retina sensações de uma paleta de cores que o meu cérebro retém e compara com outras e anteriores sensações coloridas do mundo em que vivo.

A cada nuance colorida, o meu cérebro associa um nome e mesmo outras sensações de alegria, esperança, espanto, confiança, frio ou calor. As cores são elementos da minha comunicação com o mundo que me rodeia, têm um significado modulado pela cultura ocidental em que as aprendi.

Mas há muito mais radiação para além da pequena região da luz que nos impressiona visivelmente no espetro da luz solar. Por exemplo, não conseguimos ver as radiações ultravioleta nem as infravermelhas. Também não conseguimos ver as radiofrequências nem as microondas, e assim por adiante.

Mas outros seres, que coabitam connosco este planeta, conseguem percecionar a luz para além da região do espetro visível. Por exemplo, as abelhas conseguem ver cores ultravioleta.

Este facto levou o biólogo evolucionista Richard Dawkins a referir que, para os insetos, os campos de flores são “jardins no ultravioleta”. Se para a maioria de nós as pétalas do mal-me-quer são uniformemente brancas, para uma abelha há nelas uma outra riqueza de padrões coloridos que nós não conseguimos discernir.

(É possível viver as diferenças que a radiação ultravioleta causam no aspecto das flores na exposição permanente do Museu da Ciência da Universidade de Coimbra)

É o espelho da coevolução entre as plantas com flor e os insetos que as polinizam. Ao longo de milhões de anos, a evolução natural consertou as adaptações ajustando-as para uma comunicação mais eficaz e rica entre ambos.

Imagem visível vs ultravioleta

Mas a Natureza não para de nos espantar ou pelo menos o conhecimento que adquirimos sobre ela. Num trabalho publicado na última edição da revista Science, mostra-se que, pelo menos um dado tipo de abelhões (Bombus terrestris) é sensível à carga elétrica, (ou melhor ao campo elétrico) de uma dada flor. E que esta carga elétrica da corola parece estar associada com o conteúdo em pólen que essa flor possui num dado momento.

Os investigadores descobriram que, depois de uma flor ser visitada por uma abelhão, que lhe retira pólen, a sua carga elétrica altera-se e esta mudança permanece durante alguns minutos. Assim, um outro abelhão, ao se aproximar dessa mesma flor, apercebe-se, provavelmente eletrostaticamente, que o conteúdo em pólen é reduzido nesta.

Talvez experiêncie a sensação de cabelos ou pelos em pé que nós próprios sentimos quando aproximamos, por exemplo, um braço de um superfície carregada eletrostaticamente.

Apesar de toda beleza cromática que apresenta para atrair o inseto, a flor não faz “publicidade enganosa” e comunica ao inseto que não vale a pena, naquele momento, ele nela poisar se ao pólen vem.

O abelhão agradece, pois, como em outras atividades, nesta o tempo também é precioso. Para a flor, como também em outros casos, é importante dizer a verdade para que o inseto a ela volte noutra altura de mais abundância polínica.

Para uma abelha, um campo de flores não é só um jardim no ultravioleta. Este também está repleto de sensações eletroestáticas que tornam a comunicação mais efetiva e rica de significados.

 

Autor: António Piedade
Ciência na Imprensa Reagional – Ciência Viva
Licenciado em Bioquímica, mestre em Biologia Celular e Molecular e Doutorando em Tecnologia Bioquímica pela Universidade de Coimbra.
Divulgador de Ciência com mais de três centenas de artigos e crónicas na imprensa portuguesa.
Autor de três livros de divulgação de ciência: “Íris Científica” (ed. Mar da Palavra, Coimbra, 2005, obra incluida no Plano Nacional de Leitura ); “Caminhos de Ciência” (ed. Imprensa Universidade de Coimbra, 2011); “Silêncio Prodigioso” (ed. autor, Coimbra, 2012).
Autor de vinte artigos científicos publicados em revistas internacionais de especialidade com arbitragem científica.

 

 

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