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Com um cristal, se escreve o amanhecer da Terra.

Foi descoberto um cristal com 4,4 mil milhões de anos, cuja composição e estrutura indicam que a crosta terrestre teria nessa época água no estado líquido, muito mais cedo do que os cientistas julgavam.

Esta nova descoberta vem ao encontro da hipótese de a vida poder ter surgido no nosso planeta antes do que os mais antigos registos fósseis indicam (3,4 mil milhões de anos).

O cristal descoberto é um zircão e os resultados foram publicados no último número da “Nature Geoscience”.

O cristal foi extraído de um afloramento rochoso na região montanhosa de Jack Hills, no Oeste da Austrália. O cristal examinado tem apenas 400 micrómetros de tamanho, cerca do dobro do diâmetro de um cabelo humano. Mas este minúsculo zircão abre mais uma janela sobre o início da história da Terra.

Geologicamente, o zircão é classificado no grupo dos nesossilicatos. Quimicamente, é um silicato de zircónio (Zr é o elemento químico com o número atómico 40, descoberto em 1789 por Martin Klaproth, e isolado impuro, em 1824, por Berzelius) que apresenta a fórmula química ZrSiO4. O seu nome deriva do termo “zargum”, que é palavra árabe para “vermelho” e também nome persa para “dourado”.

Dependendo das rochas onde é encontrado, o mineral zircão pode ser incolor ou ter matizes amarelo douradas, vermelhas, castanhas ou mesmo verdes! E este cristal, gema semi-preciosa, pode ser encontrado em quase todas as partes da crosta da Terra!

A razão para esta ubiquidade advém da sua antiquíssima origem e formação. De facto, ele está presente nos três principais grupos de rochas: as ígneas, as metamórficas e as sedimentares.

Esta dispersão por todo o planeta torna-o um cristal modelo para estudar os estados iniciais da formação da Terra. Mas como é que a partir de um cristal é possível saber a idade das rochas onde ele é encontrado?

O zircão “aloja” duas “impurezas” cujas propriedades radioactivas permitem a datação de períodos de tempo muito longos. Essas impurezas são átomos de urânio e de tório (símbolos químicos U e Th, respectivamente), e a sua quantidade relativa fornece informação sobre há quanto tempo estão alojados no zircão, ou seja, quando é que ele foi formado.

Ao longo de milhares de milhões de anos, os átomos de urânio incluídos no zircão transformam-se por decaimento radioactivo em isótopos de chumbo (Pb), que são átomos mais estáveis. A partir da proporção de isótopos de Pb em relação aos de U, os cientistas conseguem calcular a data de formação dos minerais onde aqueles se encontram.

Mas, no estudo agora publicado, os cientistas usaram uma segunda técnica: fizeram uma tomografia ao mineral, na qual observaram não só a proporção mas também a distribuição espacial de átomos de U e de Pb.

Esta técnica confirmou este cristal como sendo o mais antigo até agora descoberto na Terra. Segundo os cientistas, este zircão ter-se-á formado só 140 milhões de anos após a formação do nosso planeta! É pois um cristal quase com a idade da Terra.

 

Autor: António Piedade
Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva

 

 

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