A extinção do Ministério da Cultura não contribuiu só para o deserto na definição de uma estratégia cultural para o país, coisa que, aliás, já vinha acontecendo com governos anteriores, mas contribuiu sobretudo para o afastamento da cultura do discurso político nacional, enquanto instrumento poderoso de construção de uma cidadania ativa.
Esta é, obviamente, uma questão de recursos, mas é sobretudo uma questão de princípios e de visão do que queremos para o país.
A Cultura deveria ser uma área vital de intervenção do Estado, enquanto fator determinante para a coesão social, assegurando o acesso de todos à educação e ao conhecimento. E aqui reside o problema. Não existe verdadeiro conhecimento sem acesso às artes, à história, à literatura, ao teatro, à dança e à música.
Há muito se reclama, sem sucesso, um debate sério de articulação entre política educativa e política cultural. Só articulando estas duas áreas se poderá assegurar que o contacto com as artes desde tenra idade não continue a manter-se como um dos principais fatores de desigualdade social entre as crianças portuguesas.
O contacto na infância com as artes, continua, ainda, a ser um privilégio acessível apenas a algumas crianças (aquelas cujas famílias têm condições financeiras para as colocar em colégios privados, conservatórios ou outras opções que assegurem esta oferta), contribuindo assim para a construção de um fosso que muito dificilmente se atenuará a partir daqui, uma vez que o ensino público, como atualmente está concebido, não tem os meios necessários para colmatar este desequilíbrio.
O estado de degradação a que chegou o edifício que acolhe o Conservatório Nacional de Música, em Lisboa, marcando a semana que passou com inúmeras ações de chamada de atenção para a situação por parte de pais, alunos e professores, ilustra bem a importância que tem sido dada ao ensino das artes no nosso país.
Se queremos, a sério, formar cidadãos completos, precisamos trazer de volta a cultura à atualidade da agenda política, e incluir de vez as artes nos curricula das nossas escolas.
Autora: Anabela Afonso é licenciada em Relações Internacionais e mestre em Comunicação, Cultura e Artes, variante Teatro