Apresentar conceitos científicos a um público não especializado levanta diferentes questões: de que modo traduzir a importância de um tema em termos do dia-a-dia dos cidadãos, como simplificar sem perder rigor, e que tipo de ferramentas utilizar.
No que diz respeito ao último ponto, os meios visuais são hoje prevalentes, algo que decorre da própria maneira como a ciência é, não só divulgada, como ensinada e realizada. De facto é quase impossível encontrar um trabalho científico que não inclua ilustrações, gráficos, tabelas, esquemas ou fotografias.
Nessa perspetiva, a utilização da banda desenhada (BD) pode ser muito útil. A BD implica a mistura de texto e desenho em sequências que contam uma história, ou transmitem informação.
A vantagem de utilizar BD relaciona-se com a visualização imediata que oferece ao leitor, seguindo a máxima que “uma imagem vale mais que mil palavras”, por exemplo representado o desenvolvimento de um organismo através de imagens consecutivas em diferentes idades. O desafio é escolher as imagens e palavras adequadas.
Apesar de ser ainda muitas vezes entendida (erradamente) como destinada apenas a jovens, no contexto da divulgação de ciência o que importa é a linguagem da BD ser acessível a todos os leitores, que a utilizam diariamente sem disso se aperceberem.
Na verdade, a BD surge de modos “invisíveis” no quotidiano. Um exemplo clássico são instruções que explicam como montar estruturas (estantes, brinquedos), como funcionam aparelhos, ou como se efetuam certos procedimentos.
No contexto da divulgação, a banda desenhada pode ter utilizações lineares do ponto de visto informativo, ou fazer parte de projetos que refletem sobre a própria natureza, história e impacto do conhecimento científico.
No primeiro caso, incluem-se trabalhos que explicam pedagogicamente processos relacionados, por exemplo, com a saúde (vacinação, a pirâmide dos alimentos) ou ambiente (reciclagem, poluição).
No segundo caso, encontramos obras mais interessantes e ambiciosas, que têm como objectivo, não apenas transmitir informação de um modo acessível (que não simplista), mas levar o leitor a refletir sobre os conceitos científicos em causa, o contexto no qual evoluíram, e as implicações futuras que poderão ter.
Este tipo de obras tendem pois a privilegiar temas fortes, e de grande impacto.
Do ponto de vista de contextualização daquilo que avanços científicos podem representar na vida de uma sociedade o melhor exemplo continua a ser o desenvolvimento da energia nuclear (e da Bomba Atómica).
Em termos de projeção para um futuro próximo o tema por excelência é a descoberta de estrutura do DNA, com todas as consequências tecnológicas, quer já correntes (engenharia genética, organismos geneticamente modificados, diagnóstico pré natal), quer potenciais (terapia génica, modificação de seres humanos). Outros tópicos incluem ainda a Evolução ou as Células Estaminais.
Tão importante como a pesquisa e a escolha de informação ligada a um tema, é a forma como este é abordado.
Ferramentas possíveis em BD incluem dramatizações realistas baseadas em pessoas e factos históricos, ou, num outro extremo, alegorias como a antropomorfização de células ou moléculas de DNA que “explicam” ao leitor o modo como funcionam.
Nesse contexto a relação texto-desenho tem de ser pensada de modo a garantir uma transmissão eficaz, mas correta, de informação. Por exemplo: registos humorísticos podem ser muito úteis, mas apenas se não puserem em causa a seriedade global da obra.
Como com qualquer outro instrumento disponível, na banda desenhada com estas características é necessário garantir um equilíbrio permanente entre “Divulgação” e “Ciência”.
Autor: João Ramalho-Santos (Universidade de Coimbra)
Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva
Imagem: Ilustração do livro “Uma Aventura Estaminal” de João Ramalho-Santos (história) e André Caetano (desenho). Imprensa da Universidade de Coimbra, 2013