As plantas com flor, ou angiospérmicas, surgiram na história da vida no planeta Terra há pelo menos 130 milhões de anos e, depois delas, a relação entre animais e plantas mudou e intensificou-se.
As plantas angiospérmicas mudaram os ecossistemas, a paisagem com as suas pétalas coloridas. Hoje, as plantas angiospérmicas englobam cerca de 230 mil espécies por toda a biosfera.
A propósito, refira-se que a designação “angiospérmicas” deriva das palavras gregas “angios” para “urna”, e “sperma” para “semente”.
Mas já não é só na Terra há plantas com flores!
Na Estação Espacial Internacional, já floriram plantas. A estação, um laboratório espacial concluído em 2011, encontra-se em órbita baixa (entre 340 km e 353 km), o que possibilita que possa ser vista da Terra a olho nu, e viaja a uma velocidade média de 27,700 km/h, completando 15,77 órbitas por dia.
No passado dia 16 de Janeiro, o astronauta norte-americano Scott Kelly, comandante da atual missão da Estação Espacial Internacional, publicou na sua conta no Twitter a seguinte frase: “Primeira flor de sempre a crescer no espaço faz a sua estreia”.
First ever flower grown in space makes its debut! #SpaceFlower #zinnia #YearInSpace pic.twitter.com/2uGYvwtLKr
— Scott Kelly (@StationCDRKelly) 16 janeiro 2016
A flor é de uma zínia (Zinnia é um género botânico pertencente à família Asteraceae) e a notícia espalhada naquela rede social fez com que inúmeros meios de comunicação social internacionais divulgassem o acontecimento, tal como se tivesse sido a primeira vez que uma planta tivesse florido no espaço.
Mas o entusiasmo de Scott Kelly deturpou a história e os meios de comunicação social publicaram o florescimento sem terem feito uma simples investigação na internet para confirmarem a primazia afirmada pelo astronauta.
É que, em abono da verdade, não foi esta a primeira vez que uma planta cresceu e floriu no espaço, mesmo naquela Estação Espacial.
E, entre nós, que eu tivesse dado conta, só o jornalista de ciência Nicolau Ferreira, do jornal Público, investigou e escreveu a verdade sobre esta questão.
De facto, há mais de 30 anos que várias missões espaciais conseguiram que diversas plantas florissem no espaço.
Nicolau Ferreira consultou o site oficial do Guinness World Records e encontrou que “em 1982, a tripulação da estação espacial Saliut-7, pertencente à então União Soviética, cultivou a bordo algumas Arabidopsis. Durante o seu ciclo de vida de 40 dias, elas tornaram-se as primeiras plantas com flor a produzir sementes no espaço em gravidade zero”.
Acrescenta o jornalista do Público que “na estação russa Mir, entre 1996 e 1997 cultivou-se trigo, obtendo-se flores e sementes” e que “o astronauta norte-americano Donald Pettit mostrava em 2012 fotografias de uma flor de girassol durante a sua missão” na Estação Espacial Internacional.
O cultivo de plantas com flor no espaço sempre teve o objetivo científico de, por um lado, compreender o comportamento e desenvolvimento das plantas no espaço em situações de micro-gravidade, o que, por outro lado, ajuda os cientistas a compreenderem também o papel que a gravidade terrestre tem no crescimento das plantas no nosso planeta.
Além deste interesse científico, a investigação do cultivo de plantas no espaço é importante pois permite desenvolver as condições propícias para a produção de alimentos vegetais frescos para alimentar os astronautas.
Este aspeto é crucial se a humanidade empreender futuramente viagens espaciais durante longos períodos de tempo, como seria o caso da colonização de outros planetas no Universo.
Voltando às zínias, a sua escolha para a presente missão não foi ao acaso. Segundo a NASA, aprender a cultivar esta espécie de planta é uma aproximação para o passo seguinte que será o de se conseguir cultivar o tomateiro. Ambas as plantas possuem um período de crescimento semelhante e precisam de florir. O início do cultivo de tomateiros está previsto para 2017, segundo a NASA.
Este caso das zínias é mais um exemplo de como a generalidade (como em tudo há exceções) da comunicação social trata as notícias de ciência a partir de fontes supostamente credíveis: acriticamente, traduzindo, replicando e publicando sem mais investigações. É um mau serviço, não só à ciência, mas sobretudo ao jornalismo em si próprio.
Autor: António Piedade
Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva