Quando assistimos a um belo pôr do Sol, ou ao seu nascimento, vemos que o disco solar nos parece achatado. Mas, quando o Sol está alto e a forte filtragem das nuvens nos permite vê-lo sem incómodo, a sua forma mostra-se perfeitamente circular. Que razões existem para o achatamento aparente do Sol junto ao horizonte?
Quando a luz de um astro penetra na atmosfera terrestre, não o faz encontrando logo o ar como aquele que respiramos, mas sim um “ar” muito mais rarefeito.
À medida que se encaminha para a superfície da Terra, essa luz vai encontrando ar cada vez mais denso: em geral, o trajeto da luz deixa de ser retilíneo e encurva-se gradualmente (na figura 1). A este desvio da direção dos raios luminosos chama-se refração atmosférica.
Devido à refração atmosférica, um astro aparenta estar mais alto do que na realidade se encontra. Por exemplo (figura 1), um astro junto ao horizonte (direção H) é visto mais alto, na direção H’, B vê-se em B’ e A observa-se na direção A’.
Apenas no zénite Z (na direção da vertical acima da cabeça do observador) não haverá desvio. Os desvios são pequenos, mas intensificam-se muito quando nos aproximamos da direção do horizonte, como se pode ver na tabela 1.
O que é que acontece no caso do Sol? Na tabela, vemos que a refração atmosférica aumenta à medida que a altura de um astro diminui: vale menos de 1′ (1/60 do grau) para a altura aparente 45º, atinge 5,3′ quando ha=10º, mas a partir daí cresce muito rapidamente à medida que nos aproximamos do horizonte, onde alcança quase 34′ (0,57º), o que representa mais do que o diâmetro aparente médio do Sol (32′). Quando nos parece que o Sol toca o horizonte, na realidade, ele já se pôs (geometricamente).
Para pequenas alturas, uma ligeira variação de altura determina uma diferença substancial na refração, e por isso, o bordo inferior e o bordo superior do Sol serão afetados por refrações bastante diferentes.
Quando o Sol está muito próximo do horizonte, com o seu bordo inferior quase a tocar (aparentemente) o horizonte desimpedido, o bordo inferior é mais elevado (pela refração) do que o bordo superior. É por isso que o Sol nos parece achatado, quando nasce e quando se põe (esquema na Fig. 2).
Tal fenómeno reduz-se gradualmente à medida que o Sol vai elevando sobre o horizonte. Isso também sucede com a Lua.
Podemos quantificar este achatamento. Visto da Terra, junto ao horizonte, o achatamento aparente do Sol é de tal ordem que o seu diâmetro aparente vertical é 84% do diâmetro aparente horizontal. Ou seja, uma razão de cerca de 5/6. Esta forma é por vezes deformada pela turbulência atmosférica.
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Texto e ilustrações de Guilherme de Almeida
Referências
http://www.jgiesen.de/refract/index.html
http://mintaka.sdsu.edu/GF/explain/atmos_refr/astr_refr.html
NOTA: Não se deve observar o Sol sem proteção apropriada, mas, junto ao horizonte, a atmosfera terrestre atenua o seu brilho consideravelmente, podendo olhar-se por breves períodos de poucos segundos, sem filtros. Quando o Sol está alto e a densidade das nuvens cinzentas que o tapam é de tal ordem que o disco solar se mostra pouco brilhante, também pode ser observado por breves instantes. Com filtros apropriados (nunca improvisados) podemos observá-lo sempre.
Legendas das Figuras
Figura 1. Representação da refração atmosférica para estrelas a diversas alturas (a distância das estrelas à Terra não está desenhada à escala). Para maior clareza, a refração foi muito exagerada, para se poder notar, assim como a espessura da atmosfera.
Figura 2. Simulação do aspeto do Sol poente (ou nascente). Se não houvesse atmosfera, o Sol estaria abaixo do horizonte, na posição (1), também representado a tracejado em (2). Devido à refração atmosférica, o bordo inferior do Sol é aparentemente elevado 34′ e o bordo superior (naturalmente mais alto) é elevado apenas 28,9′, resultando numa forma achatada de, em média, 32′ na horizontal e 26,9′ na vertical. Em (3) mostra-se o aspeto do Sol nessa situação particular.