No dia 24 de Abril de 1917, o submarino SM U-35, da Marinha Imperial Alemã, afundou quatro navios ao serviço das forças aliadas, dois noruegueses, um dinamarquês e um italiano, ao largo do Algarve, entre Lagos e Sagres. Isso prova que não foi só em África e França que Portugal participou na I Guerra Mundial.
Cem anos depois, este momento da história vai ser recordado em Sagres, com um mergulho nos destroços de um dos navios afundados pelo submarino alemão (só para mergulhadores experientes, devido à profundidade a que os destroços se encontram), a apresentação de um livro sobre as ações do submarino alemão e o descerramento de uma placa comemorativa no Porto da Baleeira.
Este é um episódio ainda pouco conhecido, cujos contornos estão a ser desvendados, desde 2014, por uma equipa de investigadores coordenada pelo comandante Augusto Salgado e pelo historiador Jorge Russo, que está a analisar os destroços deixados pelos ataques, no fundo do mar algarvio.
Naquele dia de 1917, em plena I Guerra Mundial, o submarino alemão afundou os cargueiros a vapor SS Torvore (norueguês), os navios SS Nordsoen (dinamarquês) e SS Vilhelm Krag (norueguês) e o veleiro italiano Bienaimé Prof. Luigi.
A capitanear a embarcação germânica estava o comandante Lothar von Arnauld de la Perière (1886-1941), conhecido como “o às dos ases” e que poderá ser o responsável pelo maior volume de afundamentos realizados até hoje por submarinos, em toneladas. Só este submarino terá sido responsável por pôr no fundo do mar 20 vapores e três veleiros, de acordo com os registos existentes.
Mas não se pense que se tratava de um sanguinário comandante. Lothar von Arnauld de la Perière era conhecido como um gentleman, que dava tempo às tripulações dos navios de se porem a salvo, abandonando as embarcações antes de as afundar.
A defender a costa algarvia, estava apenas o rebocador a vapor «Galgo», transformado à pressa para missões mais defensivas da Marinha Portuguesa, mas que pouco ou nada pôde fazer, perante o poderio de fogo do submarino alemão…e porque se encontrava em Lagos quando foram ouvidas as primeiras explosões.
Um dos navios, o SS Nordsoen, depois de atingido pelas peças de artilharia do U-35 (que tinha esgotado os torpedos e estava à superfície a disparar contra as suas presas), acabou por andar à deriva e dirigiu-se até mesmo junto da falésia, na Ponta dos Caminhos. Acabou por ser afundado com cargas de explosivos, colocadas a bordo por tripulantes dos submarino. Este é o navio que jaz a menor profundidade, seis a oito metros, segundo o «Guia de Mergulho do Algarve», editado em 2009 pela Subnauta.
O veleiro italiano Bienaimé Prof. Luigi, que viajava entre Inglaterra e Génova, na movimentada rota do Mediterrâneo, foi afundado na tarde desse dia 24 de Abril de 1917, depois de o submarino alemão já ter mandado ao fundo os três vapores.
Os destroços do veleiro italiano não foram até à data localizados, até porque o diário de bordo do U-35 indica o seu afundamento numa posição cujo fundo está a grande profundidade. Por isso, com a ajuda do ROV Luso, os investigadores Augusto Salgado e Jorge Russo, com a colaboração de Paulo Costa, tentaram localizar os destroços em Maio de 2014, a mais de 650 metros de profundidade, aproveitando «uma missão de oportunidade, por cortesia» da Estrutura de Missão para a Extensão da Plataforma Continental, a bordo do NRP Gago Coutinho.
«Utilizando tecnologia de sondadores multifeixe e recorrendo pela primeira vez, na arqueologia portuguesa», à utilização de um ROV (Remotely Operated Vehicle), as buscas revelaram-se «infrutíferas, apesar da localização de uma estrutura de madeira», mas que se considera «impossível de relacionar com o veleiro, nesta fase», segundo explicaram Augusto Salgado e Jorge Russo num artigo publicado na edição portuguesa revista National Geographic Magazine, em Agosto de 2014.
Mas se as buscas pelo veleiro italiano, de madeira, não deram grandes resultados, o mesmo não aconteceu em relação aos vapores, metálicos.
Os estudos aos destroços dos navios afundados ao largo da costa algarvia, iniciados em 2014 e que se prolongaram até ao final de 2015, permitiram reunir um vasto conjunto de informações relevantes a nível arqueológico, histórico-geográfico e tecnológico.
Os destroços que estão em melhor estado são os do SS Torvore, embora, nos anos 70 do século passado, as empresas de salvados tenham retirado grande parte do metal desta embarcação. São os poucos vestígios que restam deste navio que serão visitados agora pelos mergulhadores, 100 anos depois, a cerca de 30 metros de profundidade.
E não se trata de um mergulho qualquer: um século volvido sobre o afundamento, estes vestígios passam a ser considerados património, ficando protegidos pela Convenção de Proteção do Património Cultural Subaquático da UNESCO.
As análises concretizadas pelo Centro de Investigação Naval e a Escola Naval, as entidades responsáveis por esta investigação, representam um importante contributo para o conhecimento da estratégia de guerra submarina da Alemanha, nesta época da Grande Guerra.
O comandante Salgado salienta que, ao contrário do que se pensa, este episódio passado frente ao Algarve demonstra que a I Guerra Mundial não se passou só «lá longe», «mas decorria mesmo aqui ao pé de nós».
Pelo seu contributo para um melhor conhecimento da História da Europa, o trabalho desenvolvido pelo Projeto U-35 valeu ao Centro de Investigação Naval e à Escola Naval o galardão Adopt a Wreck Award 2015, atribuído pela Sociedade Náutica de Arqueologia (Nautical Archaeology Society).
A investigação é apoiada pela Câmara Municipal de Vila do Bispo e pela empresa de mergulho algarvia Subnauta, entre outras entidades.
Programa completo:
24 de Abril – Sagres
10h00 – Apresentação do livro evocativo (Forte do Beliche)
10h45 – Assinatura de adenda ao protocolo entre a Câmara de Vila do Bispo e a Escola Naval (Forte do Beliche)
11h45 – Descerramento de placa comemorativa (Porto da Baleeira), em português e inglês
12h00 – Visita das entidades oficiais aos locais dos destroços
(Partida e chegada do Porto da Baleeira)
16h00 – Mergulho em destroços (Porto da Baleeira)
(atividade sujeita às condições marítimas e a inscrição prévia)