Durante quatro dias, a nova música portuguesa mostra-se, com honras de destaque, na 31ª edição do Eurosonic, em Groningen, na Holanda. Entre 11 e 14 de Janeiro, a maior feira de música europeia recebe 23 projetos nacionais, que, para além dos concertos, se apresentam em encontros entre profissionais do setor.
«O Eurosonic é um festival para novos talentos, uma grande mostra de novos projetos, com uma vertente profissional, com uma feira e uma conferência promovendo encontros entre managers, agentes, editoras, todo o ecossistema do cluster da música». É assim que Nuno Saraiva, diretor executivo da Why Portugal apresenta o evento ao Sul Informação-Musicália.
O responsável pela presença nacional neste evento, acrescenta que o objetivo é mostrar a música que se faz na Europa e «fomentar a circulação da música europeia dentro do espaço europeu, mas fora do país mãe de cada banda ou de cada projeto».
O Eurosonic estreou-se no mesmo ano que o (bem mais conhecido) festival South by Southwest no Austin, Texas mas, nestas três décadas de existência, a edição do velho continente não conseguiu o mesmo impacto mediático que o seu congénere americano.
Isso, no entanto, não o impediu de continuar a tentar promover a nova música europeia experimentando novas abordagens, entre elas a implementação do Country Focus – da qual Portugal é a escolha este ano – como «defesa contra a invasão cultural avassaladora da cultura americana».
Outra, foi a criação da Rede ETEP, European Talent Exchange Program, «que incentiva a circulação dos novos projetos que se apresentam no Eurosonic, em cerca de 100 festivais na Europa, recebendo incentivos europeus para promover a música europeia».
O facto de não ser reconhecido do público não é, para Nuno Saraiva, uma preocupação já que «é uma plataforma extraordinária para lançar nomes, como Arctic Monkeys, The XX ou Adele e construir sucesso fora de portas noutros territórios para estes artistas europeus. Mesmo não sendo conhecido, é muito mais útil como plataforma de lançamento para os artistas que lá vão».
Mas como é que, em 30 anos, Portugal nunca mereceu um destaque? A resposta foi dada a Nuno Saraiva em 2009, seis anos depois de ter começado a frequentar o evento, ainda como artista: «não vemos a indústria portuguesa aqui no Eurosonic. Sabemos que existe talento em Portugal, pelas candidaturas que recebemos, mas não percebemos onde está a indústria».
Foi aí que se começou a desenhar o caminho: em 2012, surgiu a AMAEI – Associação de Músicos, Artistas e Editoras Independentes, um ano depois a Aporfest Associação de Festivais de Música e em 2014 o MMF Portugal – Music Managers Forum – fundado pelo músico e manager Hélder Moutinho.
Assim, «estas redes profissionais começaram a encaixar-se nas redes internacionais que estão presentes no Eurosonic e noutros festivais.»
Finalmente, Portugal estabelecia os contactos necessários para uma maior representatividade nas «redes europeias que fazem mexer a parte da conferência profissional no Eurosonic». Faltava marcar presença na rede dos 100 festivais da rede ETEP, o que aconteceu, ainda em 2014, com a criação do Westway Lab, em Guimarães.
A indústria da música portuguesa tinha conseguido “entrar no circuito” e «começou representar os artistas portugueses nas reuniões à porta fechada dos programadoras desta rede, lado a lado com festivais como Glastonbury (Inglaterra), Roskilde (Dinamarca), Exit Festival (Sérvia) ou Iceland Airways (Islândia)».
Em 2016, é criada a Why Portugal uma plataforma que concentra os seus esforços na internacionalização dos artistas nacionais e da sua música, integrando na rede de contactos European Music Exporter Exchange e uma das responsáveis pelo destaque dado a Portugal na edição 2017 do Eurosonic.
Esta plataforma procura também «potenciar os artistas, managers e agentes para que saibam ao que vão e se preparem para interagir com essas redes profissionais. Assim, de igual para igual, conseguem promover os nossos artistas».
Mas a presença na montra da nova música europeia tem de ser conquistada e há que passar por um exigente processo de triagem. O diretor de programação do festival, Robert Meijerink, recebeu «mais de 270 candidaturas portuguesas. Fizeram uma primeira triagem artística ao conteúdo musical e ficaram com mais de 80 projetos que queriam marcar».
Seguiu-se um trabalho dedicado de escolha que olhou, não só para a componente musical, mas também para «o quão útil é que o Eurosonic, em 2017, podia ser nesta fase da carreira de cada grupo».
Ficaram reduzidos aos 21, que se apresentam em show-cases, e mais dois que marcam presença na gala de abertura.
Nuno Saraiva considera que este é um passo em frente, positivo para o país, e acredita «que Portugal não vai voltar a ter apenas um ou dois artistas por ano, vamos passar a ser como os restantes países e ter quatro, cinco, seis por ano, porque a equipa de programação ficou a conhecer a fundo o nosso ecossistema musical».
A representação portuguesa não é composta apenas pelos 23 projetos que apresentam a sua música, mas por quase uma centena de outros profissionais, entre managers, agentes e editoras, que vão procurar fechar concertos, digressões, ou negociar representantes noutros países.
Se, noutros anos, poderá não ter havido mais valias para os artistas portugueses, por falta de apoio da indústria, espera-se que este ano o desfecho seja diferente. «Quando uma banda portuguesa ia ao Eurosonic completamente desacompanhada, sem um agente na conferência a promover o seu “produto” aos outros profissionais que lá estão, obviamente que os resultados eram poucos».
Como em qualquer outra indústria, para uma bem sucedida política de exportação de um produto, é necessário definir uma estratégia, com apoio profissional e criar sinergias. Este ano, sendo o país em destaque, há o Portugal Lounge, promovido pela AICEP, «para fomentar match-makings e organizar speed-mettings entre os representantes dos nossos artistas e os programadores, agentes e promotores que lá estão, que serão quase 4500…».
Nuno Saraiva ruma à Holanda com um otimismo bem visível, sentindo que haverá um antes e um depois do Eurosonic 2017 na música portuguesa. E não é uma mera ilusão, pois já existe um resultado antecipado do destaque dado a Portugal na edição deste ano. «Ainda não chegámos ao Eurosonic e já temos um número recorde de artistas portugueses no South by Southwest, em Março. Ainda não fizemos o que temos a fazer em Groningen, mas já se fazem sentir repercussões antecipadas do destaque».
Também o Midem, o maior encontro mundial de empresas ligadas à música, que acontece anualmente em Cannes, desde 1967, está «interessado em fazer algo com a Why Portugal e com Portugal na edição deste ano em Junho».
Os algarvios Sam Alone and the Gravediggers fazem parte da seleção nacional, mas na Holanda também alinham :papercutz, Beatbombers, Best Youth, DJ Firmeza, Dj Ride, Emmy Curl, First Breath After Coma, Gisela João, Glockenwise, Holy Nothing, Marta Ren & the Groovelvets, Memória de Peixe, Moonshiners, NEEV, Noiserv, Octa Push, Rodrigo Leão, The Almost Perfect Dj, The Gift, The Happy Mess, Throes + The Shine e We Bless This Mess.
“Musicália” é uma rubrica, assinada por Pedro Miguel Duarte, que pretende dar a conhecer aos leitores do Sul Informação o que se anda a fazer no mundo da música portuguesa.