15 de Agosto, dia de Santa Maria, é motivo de muitas festas em honra de Nossa Senhora, em todo o país. Em Ferragudo, manda a tradição que Nossa Senhora da Conceição, padroeira da freguesia, desça em ombros da sua igreja para ser embarcada e passear no estuário do Rio Arade, à frente de uma procissão aquática que, este ano, reuniu perto de 40 embarcações.
Sinal dos tempos, desta vez a maioria dos barcos que participaram nesta procissão já não eram de pesca, mas antes embarcações marítimo-turísticas. Enquanto a pesca vai decaindo, são as outras atividades ligadas ao mar que vão tomando o seu lugar e até as tradições religiosas fortemente arreigadas nas gentes de Ferragudo dão conta disso.
A festa começa com o transporte da imagem de Nossa Senhora, desde a igreja matriz que fica no topo do monte, com vista privilegiada para o estuário, pelas ruas e depois pela praia da Angrinha, até ao cais junto à estação do salva-vidas, na zona ribeirinha de Ferragudo.
A procissão integra ainda a imagem de São Gonçalo de Amarante, protetor dos marítimos e pescadores.
Antes de chegar a procissão, já famílias inteiras e alguns turistas entraram a bordo de embarcações de todos os tamanhos e feitios, que vão acostando ao cais.
Com o forte vento norte que se fazia sentir neste sábado à tarde, encapelando as águas do Arade, a tarefa do embarque não era fácil, sendo preciso ajuda de braços extra para manter as embarcações estáveis e junto ao cais.
Senhoras de saltos altos, de saias a esvoaçar com o vento, homens de bengala, pais com bebés ao colo, crianças e idosos, todos entraram nos barcos que os transportavam de graça, para participar na procissão. Apesar dos gritos de incitamento e dos risos, ninguém caiu à água, nem sequer as senhoras empoleiradas nos seus sapatos de festa.
Para preparar a chegada da procissão ao cais e garantir a segurança de todos, Luís Alberto, presidente da Junta de Freguesia, a dada altura pediu às centenas de pessoas para se colocarem atrás das baias. Quando deu a ordem em português, apenas meia dúzia de pessoas se mexeu. Mas quando falou em inglês, foram largas dezenas a mudar de sítio, dando uma ideia da quantidade de turistas estrangeiros que assistiam, no cais, a esta procissão…e também do pouco que os portugueses ligam a ordens.
Quando a procissão chegou ao cais, foi a vez de embarcar as imagens, os estandartes, as lanternas e tudo o que dá corpo à cerimónia religiosa. Mas estava tudo bem organizado, com quatro barcos assinalados com bandeiras azuis com os números 1, 2, 3 e 4, para transportar, respetivamente, os estandartes, São Gonçalo, a Nossa Senhora, os padres e as figuras importantes da terra. Depois de muitos gritos e novamente depois de muitas gargalhadas, com os barcos a balouçarem nas ondinhas levantadas pela maré vazante e pelo vento, pessoas e santos embarcaram e iniciou-se a procissão.
Primeiro, o cortejo de quase 4o barcos dirigiu-se para norte, rio acima, dando a volta já perto da Ponte Velha de Portimão. Além dos barcos de pesca, do salva-vidas de Ferragudo, das lanchas para observação de golfinhos e passeios no mar, havia ainda a Santa Bernarda, uma quase caravela para passeios turísticos, e outra embarcação de porte maior, que normalmente transporta turistas ao longo da costa.
Rio acima, contra a corrente, os barcos organizaram-se em cortejo, com muitos apitos e buzinadelas ruidosas pelo meio.
Quem ficou no cais a ver a procissão fluvial – e foram largas centenas de pessoas – viu desaparecer o cortejo ao longe, na curva do rio. Mas logo depois, as embarcações deram a volta e começaram a descer o Arade, agora ao sabor da forte corrente da maré vazante. E a velocidade aumentou. «Até vai lende!», disse um velho pescador com o rosto curtido pelo mar e pelo sol, usando a expressão típica desta zona do Algarve para expressar a velocidade dos barcos.
Chegando perto da entrada da barra do Arade, entre os molhes, frente à Praia da Rocha e ao castelo de S. João, o cortejo deu novamente a volta e iniciou o regresso.
Depois de descarregadas pessoas e imagens no cais, mais uma vez sem percalços, a procissão continuou, de novo em terra, para devolver os santos à igreja, não sem que antes o Padre Miguel, o jovem pároco de Ferragudo, tenha abençoado os barcos.
A procissão integrava os Escuteiros Marítimos de Ferragudo, todos vestidos de branco, e culminava com a Banda Filarmónica de Portimão, a marcar o passo com a sua música. Pelas ruas, havia poucas colchas à janela, a saudar a Nossa Senhora, mas muitas centenas de pessoas a ver e a registar tudo nos seus telemóveis e tablets. Novos tempos.
Fotos de: Elisabete Rodrigues/Sul Informação