Sejam aves, répteis, anfíbios ou mamíferos, todos eles chegam ao Rias – Centro de Recuperação e Investigação de Animais Selvagens Ria Formosa, a precisar de cuidados e de uma nova oportunidade de voltar à vida selvagem. Dos cerca de mil animais que, por ano, dão entrada neste espaço, situado no coração do Parque Natural da Ria Formosa, em Olhão, metade são devolvidos à Natureza.
Esse foi, por exemplo, o caso de um grifo (Gyps fulvus) que, no Rias, recuperou a sua natureza de animal necrófago depois de uma experiência enquanto ave de capoeira. A história foi contada ao Sul Informação por Fábia Azevedo, coordenadora do centro. «Tivemos um grifo, que veio da zona de Mértola, que estava num galinheiro a ser alimentado a milho. A senhora que o tinha cortou-lhe todas as penas das asas e o bico. Estes animais pesam, em média, oito a dez quilos e esse chegou cá com três. Por sorte, a senhora não cortou o bico muito rente, conseguimos afiá-lo de novo e libertá-lo».
A história de animais selvagens, em particular aves de rapina, que são alvo de tentativas de domesticação é comum. «O Rias já recebeu inclusive uma águia com fitas na pata onde estava escrito “SLB”», ou «raposas com uma coleira, trela e um guizinho. As pessoas tentam domesticar os animais, mas depois vêem que estes estão a sofrer e arrependem-se. Reverter um processo de domesticação, para devolver os animais à Natureza, é difícil».
Quando os animais não são recuperáveis, o Rias não pode mantê-los durante muito tempo e tem de arranjar soluções, por vezes, pouco agradáveis. «Para os animais que são “bonitos”, procuramos encontrar um espaço onde possam estar em exposição, como zoos ou parques. No entanto, também há espécies muito comuns que não servem para exibição, como gaivotas. Nesse caso, temos de optar pelo último recurso que é a eutanásia. Há ainda uma situação que acontece por vezes, por exemplo, com as corujas. Se uma coruja estiver cega, não pode ser libertada, mas pode dar-nos uma ajuda como mãe adotiva para eventuais crias que caiam de um ninho», explicou a bióloga.
O Rias, que iniciou a sua atividade em 2009, recebe “pacientes” de todo o Baixo Alentejo e Algarve, sendo que, segundo a coordenadora, é o centro de recuperação a nível nacional que acolhe mais animais por ano. A capacidade máxima do centro é de cerca de 150 animais em simultâneo, mas essa capacidade pode ser maximizada, uma vez que nem todas as câmaras de recuperação estão a funcionar.
Segundo Fábia Azevedo, «temos instalações exteriores de grandes dimensões e adaptadas a diversos tipos de animais. No entanto, não estão a funcionar a 100%».
As razões para que isso aconteça estão relacionadas com o financiamento. As receitas do centro não chegam para todas as despesas: gastos com o pessoal, manutenção, tratamentos e alimentação para os animais.
«Neste momento, temos muita dificuldade em conseguir carne para os animais. Temos o apoio da Makro, mas não é suficiente. Para além disso, temos falta de redes – de sombra e metálicas – madeiras para estruturas, poleiros e caixas, torneiras – que nos vêm roubar…», lamenta a responsável.
Desde a sua abertura que o Rias tem o apoio da ANA Aeroportos que suporta três salários, mas segundo Fábia Azevedo «três funcionários para mil animais por ano não chega e queríamos aumentar a equipa». Atualmente, o Rias tem também dois estagiários ao abrigo dos programas do IEFP e alguns voluntários, mas fazem falta mais.
«Aqui toda a gente faz tudo. A nossa ideia seria arranjar forma de estabilizar esta equipa que temos agora. Mas também precisamos de estagiários que queiram vir trabalhar connosco e voluntários. Estamos abertos a recebê-los nas mais variadas áreas. Por exemplo, nas áreas do marketing e da informática fazia falta», acrescenta.
A falta de verbas que dificulta o trabalho no Rias nunca deixou nenhum animal “à porta”, mas influencia em algumas decisões que são tomadas. «Nunca recusámos nenhum animal, mas temos que ser materialistas em algumas situações. Se calhar não vamos gastar dinheiro a fazer uma cirurgia a um animal de uma espécie mais comum como uma gaivota-de-patas-amarelas [Larus michahellis], que não está ameaçada… Se calhar, poupamos esse dinheiro para fazer a mesma cirurgia a um abutre-preto [Aegypius monachus], bastante ameaçado».
Campanha de apadrinhamento para empresas está em marcha
O Rias lançou, no final de fevereiro, a 2ª edição da Campanha de Apadrinhamento do Rias para empresas, que permite a uma companhia apadrinhar um animal ou uma espécie.
O Centro está a desenvolver contactos, mas, para já, apenas a Niobo, em Olhão, aderiu à iniciativa, apadrinhando as cegonhas brancas (Ciconia ciconia). «A Niobo apoiou na primeira campanha e, no caso de apadrinhar toda uma espécie, como é o caso, é válido por dois anos», explica Fábia Azevedo.
Nesta campanha, o apadrinhamento de uma espécie tem um custo de 500 euros e de um animal apenas 250 euros. «Este ano, esperamos ter mais empresas a apoiar, desenvolvemos também outro tipo de abordagem com envio de e-mails e reuniões presenciais. Os valores que pedimos não são extravagantes, para uma empresa grande. Uma empresa dar-nos 500 euros não é muito», considerou.
No entanto, o Rias tem também campanhas de apadrinhamento para pessoas individuais e para escolas. «Temos um total de cerca de 30 padrinhos por ano e, no ano passado, lançámos uma campanha para escolas, em que uma turma apadrinha o animal, vem fazer atividades didáticas connosco e, depois, vem libertar o afilhado», conclui a coordenadora.