O retorno potencial para Portugal, no caso da exploração de hidrocarbonetos avançar mesmo, no Algarve e noutros pontos do país, será sempre inferior a 10% do lucro que a atividade gerar.
À margem de uma sessão de esclarecimento sobre a prospeção e pesquisa de petróleo e gás natural, no mar ou em terra, que decorreu esta terça-feira em Faro, o presidente da Entidade Nacional para o Mercado de Combustíveis (ENMC) falou em 6% de retorno, para Portugal, mas depressa remeteu números mais concretos «para os contratos disponíveis no site da ENMC».
As garantias ontem dadas pelo responsável pela entidade reguladora e pelos representantes das petrolíferas que ganharam as concessões não convenceram o muito público presente, que se pode considerar ter representado bem a sociedade civil do Algarve, já que juntou empresários, autarcas, deputados, membros de associações e outros cidadãos. Todos eles deixaram bem claro que não querem que haja exploração de hidrocarbonetos no Algarve.
Da parte do responsável máximo pela ENMC, foi passada a mensagem, para início de conversa, de que «ninguém gosta de petróleo, nem eu, nem vocês, mas enquanto a sociedade for viciada em combustíveis fósseis, há que explorá-los». Declaração que lhe valeu muitos apupos, mas que não impediu Paulo Carmona de a repetir e de afirmar que, caso se encontre petróleo, «ficaremos ricos».
Analisando as suas palavras, mais tarde, não fica nada claro que assim seja. Talvez por isso, Paulo Carmona não se quis alongar sobre as contrapartidas previstas pela atribuição de concessões a companhias petrolíferas.
Já a ativista anti-exploração de petróleo no Algarve Elvira Martins, que tem vindo a estudar os contratos a fundo, não teve problemas em fazê-lo e lembrou que o que se prevê é que, numa primeira fase, – «e já depois de pagos os custos de prospeção, pesquisa e instalação e descontados os custos de produção» – , Portugal comece a receber uma verba «que será inicialmente de 3 a 5 por cento», podendo aumentar posteriormente, sem nunca ultrapassar os 10 por cento.
E se, para Elvira Martins, o retorno económico potencial do petróleo é uma «questão secundária», já que o que está em causa «é o modelo de desenvolvimento, que não é o que queremos para Portugal», para os empresários e autarcas este poderá ser o principal argumento para tentar travar o avanço para a fase de exploração de hidrocarbonetos.
Representantes de associações empresariais e autarcas algarvios fizeram questão de marcar presença e já se sabia ao que vinham, uma vez que, poucas horas antes da sessão de esclarecimento, tinham tomado uma posição conjunta de oposição aberta a este tipo de operações, no mar ao largo do Algarve e em terra.
E o argumento acaba por ser simples: numa região turística que gera valias de mais de 5 mil milhões de euros, em exportações, para a economia nacional, é impensável avançar com uma atividade que nunca dará lucros na mesma ordem e pode “matar” a galinha dos ovos de ouro.
O presidente da associação empresarial NERA Vítor Neto confrontou a ENMC e os representantes das empresas petrolíferas, lembrando o peso do Turismo do Algarve para a economia nacional. Já a exploração de petróleo poderia, eventualmente (a possibilidade, ninguém negou, é remota), permitir a Portugal saldar a sua fatura energética, o que, segundo estudos, «significaria uma poupança de 1,5 mil milhões de euros».
E se aqui a balança parece estar bem desequilibrada, para o lado do Turismo, no que toca à criação de empregos, a diferença torna-se descomunal. O dirigente associativo diz que a atividade turística na região é responsável por «150 mil postos de trabalho».
Segundo Paulo Carmona, que apontou o emprego como um dos fatores positivos da exploração de petróleo, esta atividade poderá criar «centenas de postos de trabalho, até mesmo um milhar», muitos dos quais, salientou, altamente qualificados.
Da parte dos autarcas presentes, chegou também uma nega rotunda à exploração de petróleo, principalmente onshore, ou seja, em águas pouco profundas ou em terra. Jorge Botelho deixou mesmo a questão, que acabou por não ser respondida, sobre quais serão os impactos visuais da exploração.
O presidente da ENMC, perante a insistência dos jornalistas sobre quais os impactos ambientais e as consequências sociais e económicas de uma eventual exploração de petróleo no Algarve, disse que estes são «do tipo de argumentos que se devem apresentar na fase de consulta pública», que poderá eventualmente acontecer, caso algum dos concessionários avance com um plano de exploração de hidrocarbonetos, no futuro.
Algo que está longe de ser uma certeza, como a ENMC frisou por diversas vezes, já que, «desde 1939, foram feitas 175 operações de prospeção e gastos mais de 900 milhões de euros em pesquisas científicas, sem nunca se encontrar petróleo ou gás natural em quantidade suficiente para viabilizar a sua exploração».
Esta aparente ausência de petróleo e gás natural em quantidades que tornem a sua exploração rentável, em Portugal, não impediu os cinco concessionários de assinar contratos e de investir, até ao momento e desde 2011, 58 milhões de euros só em prospeção e pesquisa. Aliás, este assumir de risco é aquilo que, segundo foi explicado na sessão, leva a que a contrapartida para Portugal seja tão baixa, «em linha com a que cobram outros países, como a Espanha».
Simplificando a questão, e comparando com a Noruega, país rico em combustíveis fósseis e repetidamente usado como exemplo pela ENMC, Portugal sujeita-se a percentagens de retorno muito baixas por ser um país não produtor, ou seja, em que a probabilidade de encontrar hidrocarbonetos é muito reduzida. Já na Noruega, é muito provável encontrar petróleo ou gás natural, pelo que a contrapartida anda na ordem dos 90 por cento.
Ou seja, no caso de Portugal, as empresas petrolíferas exigem altos rendimentos, pois, de certa forma, estão a fazer “o favor” de realizar levantamentos geológicos e mapeamento que reverterá para o Estado português, mesmo que não seja encontrado petróleo. Já na Noruega, é o Estado que permite às empresas explorar as suas ricas e apetecíveis reservas.
Da parte dos autarcas foi dada, ainda, a garantia de que «tudo farão para tentar reverter e anular todos os contratos existentes», relacionados com o Algarve.
Segundo revelou ao Sul Informação Jorge Botelho, à margem da sessão, há já uma reunião agendada com o Governo para o final do corrente mês de Janeiro.