O Sul Informação falou com personalidades ligadas a diferentes áreas, desde empresários a dirigentes associativos, passando por responsáveis de entidades públicas e autarcas, para saber a sua visão sobre a vitória do «Não» à permanência na União Europeia no referendo desta quinta-feira, no Reino Unido:
Desidério Silva (presidente da Região de Turismo do Algarve)
«Agora, vamos viver momentos de preocupação, até as coisas estabilizarem de novo. Para já, os sinais da desvalorização da libra não são boas notícias para o Algarve. Esperemos que o impacto não seja tão negativo como agora se antecipa. As coisas mudaram muito e há factores que não controlamos. Vamos esperar para ver…»
Isilda Gomes (presidente da Câmara Municipal de Portimão)
«Vejo o resultado do referendo com preocupação, não só pelo que possa acontecer ao investimento da comunidade britânica no concelho de Portimão, que tem vindo a aumentar nestes últimos tempos, mas também pela situação da Europa, tal como a conhecíamos. Receio que esta escolha dos britânicos possa ter um efeito de dominó, já que pode haver outros países a quererem sair da União Europeia. Considero que esta vitória do «Não» deve levar os líderes europeus a questionar se o que tem sido feito na Europa é o correto ou não. A União Europeia, como tem sido gerida nestes últimos anos, criou uma grande desilusão entre os cidadãos. E houve até um acréscimo de desigualdades entre os países, com diferença de tratamento entre países e com um rigor a ser aplicado apenas a alguns países, aos mais frágeis, como Portugal ou a Grécia, que têm sido os mais penalizados. Este grande abanão deverá levar a uma reflexão profunda. Espero que este abanão não faça cair a Europa, mas espero também que alguma coisa mude, e de forma profunda».
Vítor Neto (presidente do NERA – Associação Empresarial da Região do Algarve)
«Já sabíamos que a saída do Reino Unido da UE era uma hipótese. Agora, temos de ter uma atitude serena, racional e confiante. Este é um mercado com raízes muito profundas, no Algarve, não é um mercado ocasional. Temos de ter a consciência de que as relações são muito fortes e irão continuar. Mas temos de fazer um esforço de aproximação e aprofundamento das relações com os operadores e os clientes, não podemos ser meros espetadores. Será o que outros destinos concorrentes, dentro da União Europeia, vão fazer. Teremos de exigir este esforço ao Governo, bem como medidas que possam facilitar a vinda dos turistas britânicos para Portugal».
Rui André (presidente da Câmara Municipal de Monchique)
«Acolhi a notícia com alguma tristeza e apreensão. O processo que agora se vai desencadear é um teste à Europa e ao próprio Reino Unido. Há a possibilidade de a Escócia sair e, quem sabe, de até se manter na União Europeia. Vamos ter agora um período até que esta poeira assente, para clarificar o que se vai passar. No caso de Monchique, além de ter sido o concelho escolhido nos últimos dois anos pelo primeiro ministro David Cameron para as suas férias, tivemos recentemente um grande investimento britânico, a compra e reabertura do resort McDonalds. Penso que os ingleses vão sempre optar pelo Algarve como local de férias, de segunda habitação ou mesmo de residência permanente, porque a nossa região continua a ser muito segura e aprazível. Não quero acreditar que vá haver um abrandamento no investimento britânico no Algarve e em Portugal em geral, mas tudo dependerá de como a Libra se comportar. O facto é que, tendo optado por sair da União Europeia, o Reino Unido continua a ser da Europa. Continuará a haver relações económicas e outras, há um interesse mútuo para que isso continue, nomeadamente entre Portugal e o Reino Unido».
Elidérico Viegas (presidente da AHETA – Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve)
«Lamentamos a saída do Reino Unido da União Europeia. É um mercado estratégico e prioritário para o Algarve e qualquer convulsão económica ou social pode ser má para o Algarve. Não se pode prever o que se irá passar, mas estamos preocupados, como é natural. Mas, para este ano turístico, não é previsível que haja problemas, já que as reservas estão feitas e está tudo contratualizado. Pode é sentir-se algum impacto ao nível da perda de poder de compra, por parte dos turistas britânicos, face à desvalorização da Libra».
Bruno Carlos (CEO da empresa Claranet SOHO)
«Para a Claranet SOHO, não antevejo problemas, pois trabalhamos essencialmente para o mercado interno. Não estou a ver o Brexit a afetar muito as empresas do setor tecnológico. A médio prazo até poderemos assistir a empresas do setor tecnológico a saírem do Reino Unido para outros países, sendo Portugal e até mesmo a região algarvia um potencial destino para essas empresas. Mas claro que, como algarvio, esta saída do Reino Unido da União Europeia me deixa preocupado».
Eliseu Correia (CEO da EC Travel)
Tal como eu esperava, os Britânicos votaram pela saída. Toda a sua História apontava nesse sentido e não é preciso explicar porquê. A vontade dum povo é soberana e pelo menos isto é mais honesto do que querer estar, mas só no que convém, e rejeitar o que não interessa. A economia é algo muito complexo e, assumir desde já que a libra vai desvalorizar e prejudicar fortemente o nosso Turismo, é precipitado, porque acho que sim, no primeiro impacto, mas depois irá recuperar. Há que deixar assentar a poeira. Veremos. Quanto à “União” Europeia, convém fazer jus a essa palavra, porque, se assim não for, será debandada geral e o fim da moeda única. E pronto, é a vida…baralha e dá de novo, teremos que nos adaptar. Como sempre.
João Soares (delegado no Algarve da Associação dos Hóteis de Portugal)
«Obviamente que era importante para nós que o Reino Unido não tivesse saído da UE. Agora é preciso alguma cautela e evitar alarmismos. Acreditamos que se irá manter o fluxo de turistas e, eventualmente, até poderá aumentar, devido às convulsões que se verificam noutros destinos concorrentes. A única coisa que nos preocupa é o preço. Será expectável que as operadoras turísticas se aproveitem da situação [para procurar baixar preços]. Mas é preciso ter calma, não podemos ver, para já, um drama nesta situação».
Alexandra Gonçalves (diretora regional de Cultura do Algarve)
«Naturalmente que vamos ter algum impacto ao nível das economias. A Libra está a desvalorizar, as bolsas estão em queda. Mas isto pode ser apenas uma primeira reação. Seria mais grave se o Reino Unido tivesse entrado no euro e agora quisesse também sair do espaço euro e da União Europeia. Mas há ainda muita coisa a definir. O que vai acontecer daqui para a frente, e com a demissão de David Cameron, vai também depender das eleições próximas e do Governo que delas sair. O Reino Unido não se sentia bem nesta União Europeia e quis sair. A decisão do povo foi soberana, concorde-se ou não. A Democracia é assim. Eles recusaram, no fundo, fazer parte de uma soberania europeia, para voltar a ter uma soberania apenas nacional. Para nós, em Portugal e no Algarve, em termos turísticos, poderá haver algum impacto, mas não será tão grande como algumas pessoas têm anunciado. Os britânicos vão continuar a viajar e o Algarve continuará a estar no topo das suas preferências. Os que cá estão a viver, continuarão tranquilamente a fazê-lo. É verdade que poderá haver efeitos económicos no Reino Unido que provoquem uma contração nas viagens dos britânicos. Mas, se tal acontecer, isso até poderá servir para que nós, aqui no Algarve, repensemos a estratégia da nossa região enquanto destino turístico».
Hugo Nunes (vice-presidente da Câmara Municipal de Loulé)
«São momentos de apreensão por aquilo que é o projeto europeu e a União Europeia, mas também de apreensão pelo impacto que terá na economia do concelho e da região. A desvalorização da Libra, que já se fez sentir, provavelmente nesta época não terá um impacto muito grande, mas vai fazer com que um conjunto de pessoas repense o seu destino de férias, até pelas complicações que passam a ter para vir cá. Se deixarmos de lado esta grande casa que era a Europa, o papel importante que o Reino Unido tem na Europa e na União Europeia, e se pensarmos de forma mais próxima, e mais ligada ao nosso dia-a-dia, temos razões para nos preocuparmos com o que é o nosso futuro no curto prazo».
António Branco (reitor da Universidade do Algarve)
«Há aqui duas dimensões distintas. Neste momento, ainda é muito cedo para se compreender quais serão as consequências da saída do Reino unido da União Europeia, para o Algarve, para Portugal e para a Europa. Vai ser um processo complexo, que demorará muito tempo e que dependerá de muitos fatores, pelo que seria precipitado falar disso.
Noutro plano, tendo em conta aquilo que me parece ser uma degradação muito grande dos valores e princípios que estiveram na origem e na fundação do que hoje se chama União Europeia, não me surpreende que tenha acontecido o que aconteceu neste referendo, já que deve ter havido razões muito variadas para votar Não. Pergunto-me até se não haveria resultados semelhantes noutros países – Itália, França, Holanda – se neste momento fossem realizados referendos no mesmo sentido. Eu gostaria que esta fosse uma oportunidade para a Europa perceber que tem que mudar de rumo, mas não estou certo se será essa a reação dos dirigentes europeus com maior capacidade de decisão».
Rui Nunes (diretor da Faculdade de Economia da Universidade do Algarve)
«Este é um tema complexo, que pode ser olhado de diversos ângulos. Há os efeitos imediatos sobre as economias, que passam pela oscilação nas bolsas de valores e pelos preços das matérias primas. Em relação ao Algarve, não vejo que a saída do Reino Unido da UE possa ter efeitos imediatos. Estamos em plena época alta e os contratos estão fechados. Nos próximos anos, poderá haver, ou não. É difícil fazer uma previsão a tão longo prazo, depende muito do que a União Europeia e o Reino Unido fizerem. Para Portugal, o Brexit até poderá ser benéfico, caso promova uma mudança de política na União Europeia, que aposte no crescimento económico e na coesão social, em detrimento da austeridade».