Já pensou em sair à noite com amigos, num carro espaçoso, com bar, motorista, passadeira vermelha…? Está a pensar numa limusina? Errado. Isto é o que pode ter em Albufeira, num… carro funerário.
A incomum ideia de fazer tours turísticas na noite algarvia utilizando um carro funerário foi a solução encontrada para dar uso ao veículo que os amigos Nelson Silva e José Gonçalves compraram, por impulso, depois de uma noite em que saíram para beber café.
«Isto começou como começam todas as noites: com um “vamos beber café”. Fomos beber um cafezinho, a noite continuou, divertimo-nos e, depois de estarmos alegremente bem dispostos, devido aos efeitos do álcool, fomos fazer o que muitas vezes fazemos: adoramos carros clássicos e, por vezes, vamos à Internet à procura de oportunidades. Eram 4 e tal da manhã. Procurámos carros por ano, como fazemos sempre, e, no meio da pesquisa, aparece o carro funerário. Eram 4 da manhã e não ligámos logo. Esperámos pela manhã seguinte», contou José Gonçalves ao Sul Informação.
A senhora que procurava vender o veículo atendeu o telefone e o o carro estava ainda para venda – «é óbvio que estava, ninguém compra uma coisa destas», graceja Nelson Silva.
«De início, a senhora não nos levou muito a sério, mas já com uma ideia do valor, fomos a casa, partimos os porquinhos mealheiros, cada um o seu, vimos as moedas que tínhamos e fomos para cima, porque o carro estava no Alentejo. Vimos o carro e ótimo: negócio feito. E voltámos ao Algarve», lembra José Gonçalves.
Na viagem de regresso, José Gonçalves notou algo estranho na viatura «o carro devia estar fechado há muito tempo e havia um certo cheiro a morto lá dentro. Nas primeiras semanas, comprámos aí uns 30 ambientadores». No entanto, a opinião sobre o cheiro diverge, porque, para Nelson Silva, o odor era apenas a «madeira».
Os dois amigos não só não revelam o valor da compra, como juraram não o fazer. No entanto, dão a entender que foi um bom negócio e ainda com um bónus: «a senhora disse-me: “olhe amigo, leva o caixão que está lá dentro, está novo, nunca foi utilizado!”».
O problema veio depois: «quando acordámos, é que pensámos: “comprámos um carro funerário, o que é que vamos fazer a isto?”», conta José Gonçalves.
«Ainda pensámos em ir a Odemira, para vender a surfistas, como é largo, podia ser bom por causa das pranchas de surf. E, como nos orientámos bem no negócio, pensámos metemos mais um “x” em cima e vender», acrescenta Nelson Silva.
Mas, depois, veio mais uma noite de copos, que coincidiu com o divórcio de Nelson Silva. «Isto acabou por surgir na sequência da comemoração do divórcio dele», conta José Gonçalves, que é prontamente interrompido por Nelson: «eu fui o primeiro cliente da Ripper Tours!».
«Nessa noite, pensámos: “e por que não fazer passeios turísticos no carro?”. Na primeira vez que dissemos isto, soou bem, mas, nos dois minutos seguintes, dissemos logo: “não, esquece, ninguém vai entrar lá dentro», lembra José Gonçalves.
Enganaram-se. Os amigos com quem falaram consideraram a ideia «genial» e tudo aquilo começou a fazer sentido. «Falámos com um amigo que tinha uma gráfica, pintámos e arranjámos tudo em casa e colámos o vinil no carro».
Depois, veio a parte burocrática que também foi afetada pela “estranheza” de aliar turismo a um carro funerário. «Quando criámos a atividade de animação turística, porque o objetivo é fazer tours na noite algarvia, tivemos de mandar os documentos do carro e ligaram-nos logo a dizer que nos tínhamos enganado porque mandámos um livrete de um carro fúnebre».
Não era engano e a Ripper Tours começou mesmo a operar em Maio de 2016. A partir daí, foi sempre a crescer e interessados não faltaram. «Houve uma página do Facebook que nos descobriu, o Ruim, e que nos mandou uma mensagem a perguntar “o que são vocês?”. Contámos a história e ele falou de nós. A partir daí, disparou. Saímos numa revista automóvel, depois na Rádio Comercial… foi um boom autêntico. No início do Verão, estávamos todas as noites na rua».
No entanto, quando o Verão entrou no auge, houve um problema: «quando começou a subir mesmo, as chaves da carrinha foram roubadas. Estivemos no pico do Verão com o carro parado e só voltámos a trabalhar há uns dois meses».
Apesar do pouco tempo de operação, Nelson Silva e José Gonçalves conseguem analisar quem mais aprecia passar uma noite, com amigos, num carro funerário: «temos mais portugueses, 60 ou 70% dos clientes que temos são portugueses e nós pensámos que isso nunca ia acontecer!».
Quando a Ripper Tours foi criada, «achávamos que íamos ter um determinado perfil, achámos que ia funcionar com jovens estrangeiros, mas a prova que temos é que resulta para toda a gente, portugueses e estrangeiros, novos e velhos. Já tivemos um casal na casa dos 60 anos», conta Nelson Silva.
Para quem ainda não percebeu como funciona uma noite passada no carro funerário da Ripper Tours, José Gonçalves explica: «proporcionamos a experiência de uma noite em Albufeira. Fazemos com os nossos clientes o que fazemos com os nossos amigos. Vão aos sítios e bares onde costumamos ir, convivemos com eles, vamos sair com eles. Somos uma experiência única, porque, em nenhum sítio do mundo, se chega a uma discoteca num carro funerário, alguém abre a porta, põe um tapete, abre-se um caixão que tem bebidas e que são distribuídas pelo pessoal».
Sim, porque o caixão guarda… bebidas. «O caixão é onde temos a nossa welcome drink, mas é uma welcome drink para toda a viagem. Quando alguém tem sede, encostamos, puxamos o caixão para fora e servimos», conta Nelson Silva.
Para José Gonçalves, a Ripper Tours conseguiu «desmistificar a ideia negativa do carro e da morte, que transformámos numa coisa completamente positiva e numa experiência nova».
Apesar disso, há opiniões dissonantes. «Nunca tivemos grandes problemas com ninguém, mas já nos disseram que é uma porcaria o que fazemos, que devíamos ter respeito. O que dizemos é que é apenas um carro, um acessório».
José Gonçalves e Nelson Silva não têm na Ripper Tours a sua ocupação principal: «mantemos o nosso trabalho, dá para conciliar». No entanto, para o ano, e porque ambos querem que seja «a bombar todos os dias», já pensam em contratar duas pessoas para o período de Verão.
Dentro de dias, chega o Halloween e sair à noite num carro funerário não podia ser mais apropriado, para comemorar a data. Para essa noite, os fundadores da Ripper Tours preparam surpresas. «Já temos reservas e várias ideias na calha. Podemos revelar uma: vamos ter uma máquina de imperial móvel, que funciona com um sistema de caixão. Vai ser o primeiro caixão do Mundo com máquina de cerveja», revela Nelson Silva.
Uma noite guiada pela Ripper Tours custa 72 euros, para seis pessoas. «O único preço que nunca diremos é o preço da carrinha. E, se conseguirem encontrar a velhota que a vendeu, também acreditamos que não vai dizer», conclui José Gonçalves.
A atividade desta empresa e as ofertas especiais que vão surgindo podem ser seguidas na página de Facebook de Ripper Tours.