Não é nenhuma Torre de Babel e, talvez por isso, teve o condão de colocar pessoas de muitas nacionalidades e culturas diferentes a falar a mesma “língua”.
A torre de 21 metros de altura prevista no Plano de Pormenor da Zona Histórica de Olhão, um dos elementos do documento que foi mais contestado pela população (mas não o único), foi “riscada” pelo presidente da Câmara olhanense António Pina no final de uma sessão de esclarecimento com a população que decorreu esta terça-feira à noite.
Uma decisão passível de sossegar muitas almas, mas que não deverá ser suficiente para aplacar a indignação e contestação das mais de 1750 pessoas que já assinaram uma petição contra a aprovação do plano, a larga maioria das quais estrangeiras. Esta iniciativa foi lançada por um arquiteto belga residente em Olhão, Pascal Duval, e já foi assinada por pessoas das mais diversas nacionalidades (residentes e não só), «entre os quais 150 arquitetos, historiadores, urbanistas e até o curador do Museu de Amesterdão», segundo o também arquiteto Filipe Monteiro.
António Pina ouviu os técnicos explicar à população a filosofia do plano, as muitas críticas e dúvidas dos cidadãos que encheram o auditório da Biblioteca Municipal e, no final, anunciou que aceitava deixar cair a edificação da discórdia, apesar de defender a existência de uma infraestrutura que sirva o mesmo propósito.
Para perceber para que serviria uma torre de 21 metros, bem acima da cércea dos edifícios à volta e até da torre sineira da Igreja Matriz, há que voltar atrás, à apresentação e posteriores esclarecimentos dados pela equipa do Baixa Atelier, responsável pela elaboração do plano.
Esta torre iria servir um propósito duplo, o de depósito de água e o de miradouro sobre a cidade, mais precisamente sobre os bairros típicos da Barreta e do Levante e todo o casco urbano histórico da cidade. Por baixo, seria construído um edifício novo, no lugar do imóvel centenário agora existente e propriedade da Câmara, que albergaria um Posto de Turismo e serviços camarários.
Uma ideia que não vingou junto daqueles que estiveram a assistir à sessão, apesar da insistência por parte dos autores do projeto em garantir que a inclusão da torre era meramente indicativa e que não implicava a sua efetiva construção.
As razões pelas quais os presentes e muitos outros que não compareceram contestam a torre de 21 metros foram bem resumidas por Horta Correia, professor de História de Arte e Arquitetura da Universidade do Algarve.
«A torre está prevista para um edifício que data, provavelmente, do século XVII, de arquitetura muito interessante. A sua fachada está orientada à Igreja da Soledade, o primeiro edifício de Olhão. Este é um edifício que os olhanenses não vão deixar destruir. Vocês não conhecem bem os olhanenses, aconselho que leiam o livro “Olhão Fez-se a si próprio”, de António Rosa Mendes», disse o professor jubilado da UAlg, dirigindo-se à equipa técnica do Baixa Atelier.
E esta não foi a única provocação que Horta Correia dirigiu à equipa liderada pelo arquiteto Pedro Ravara. «Dou os parabéns pela forma hábil e inteligente como tentaram convencer o povo de Olhão da bondade deste plano. Tanto que eu quase me converti», ironizou, arrancando aplausos e provocando risos generalizados. Na visão do professor universitário, este plano «não é adequado à realidade» dos bairros históricos de Olhão e a sua intenção é «densificar, densificar, densificar», ao invés de reabilitar.
Pedro Ravara defendeu o projeto da sua equipa, garantindo que, nos bairros típicos da Barreta e do Levante, «não é permitido elevar as cérceas» e que o sistema de arruamentos estreito «é para manter». A única exceção são os edifícios que dão para a Avenida 5 de Outubro, que poderão crescer «até uma altura de 9 metros». Uma permissão que levará, segundo Fernando Grade, da Almargem, a que «as açoteias e mirantes dos bairros típicos fiquem sem vista para a Ria».
Esta é apenas uma das muitas outras razões, além da construção da torre, que estão na base da forte contestação a este Plano de Pormenor, que ficou bem patente na reunião de ontem. Como ilustrou ao Sul Informação, no final da reunião, Antónia Williams, estrangeira residente em Olhão e uma das dinamizadoras da petição que está a correr, há também fortes dúvidas em relação ao material que será escolhido para a pavimentação das ruas e dos passeios.
«Nenhum de nós acredita que não vão retirar a calçada», assegurou, apesar de tanto os responsáveis pelo plano como o presidente da Câmara terem garantido que os passeios seriam em calçada e as ruas «com escarpão, a pedra que sempre foi usada em Olhão».
Neste momento, ainda decorre a discussão pública do plano e qualquer pessoa poderá apresentar propostas até ao dia 28 de Novembro. Os interessados podem fazê-lo preenchendo o formulário disponível online, que podem entregar diretamente nos Serviços do Balcão Único da Câmara Municipal de Olhão ou através dos correios. Segundo a Câmara, «está disponível no Balcão Único um exemplar em papel da proposta do plano para consulta dos interessados».