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São úteis, funcionais e o seu design é moderno, apelando aos gostos mais exigentes. Mas as peças que saíram da residência artística «Designers de Loulé» também carregam consigo uma mensagem política: o trabalho dos artesãos, apesar de altamente especializado, é desvalorizado e mal pago. Se depender dos três designers louletanos convidados para participar nesta iniciativa do programa Loulé Criativo, essa realidade tem os dias contados.

Os 35 produtos que saíram desta comunhão de esforços entre designers e artesãos louletanos estão em exposição desde a passada sexta-feira numa loja no centro histórico de Loulé, paredes meias com o emblemático Café Calcinha, e podem ser vistas até dia 17 de Abril. Nas seis montras do espaço rebatizado de «Designers de Loulé», instalado num estabelecimento comercial que até agora estava desativado, podem-se ver peças feitas de diversos materiais, com predominância para a cerâmica, empreita, madeira e cobre. Em alguns casos, os materiais “casam” para dar forma a determinada peça.

Henrique Ralheta, Vanessa Domingos e Hugo Silva trabalharam de perto com dez artesãos de Loulé, ao longo de meses, para dar forma às ideias que colocaram no papel, depois da residência artística em que estiveram envolvidos, em Setembro. Um processo de criação, aprendizagem e solidificação de afetos, que não deixou os três jovens criativos indiferentes, como estes revelaram numa entrevista ao Sul Informação.

«Nas duas semanas que estivemos aqui em residência, para além de procurar inspiração, nós tentámos entender  as  dinâmicas e as questões sociais envolvidas. E detetámos isto. Nós já tínhamos ideia que eram produtos baratos e mal pagos, mas, contas feitas, é assustador o rendimento por hora destas pessoas», que, muitas vezes, ronda «um euro por hora», contou  Henrique Ralheta, curador da residência artística.

«Isto é muito mau. É mau para os artesãos e para a possibilidade de continuação destas profissões. Porque as novas gerações, que já não o fazem por tradição familiar, não se vão interessar por estas áreas, pois não encontram aqui uma fonte de rendimento», considerou. «O que nós achamos é que o design pode dar um contributo para o reconhecimento do que é feito à mão», resumiu o designer louletano.

Tendo isso em conta, este designer decidiu dar nomes às peças que produziu em conjunto com artesãs de empreita que remetem para o tempo que demoraram a ser feitos. Assim, pode-se encontrar desde uma taça de uma hora até um candeeiro de 15 horas.

«Não nos podemos acomodar à ideia de que tudo o que é fruto do trabalho do artesão é algo que está esquecido e não tem valor. Nada disso! Não vejo mal nenhum que as pessoas saibam quanto tempo as coisas demoraram a fazer, antes pelo contrário. Estão ali muitas horas de trabalho e um saber que foi apurado ao longo de gerações, bem como o saber do contemporâneo designer. Portanto, se o consumidor tiver consciência do valor intrínseco da peça, talvez se predisponha a pagar mais por ela», considerou, por seu lado, o presidente da Câmara de Loulé Vítor Aleixo.

Apesar das dificuldades, ainda há quem batalhe para manter estes ofícios vivos. Entre eles estão Marco Cristovam (ferreiro), Analide Carmo e Francisco Dias (caldeireiros), Cremilde Sousa (artesã da empreita), Fernando Henriques (artesão da madeira), Fernando Zuninga (artesão do cabedal), José Amendoeira (cesteiro), Manoli Ortiz de La Torre (artesã da lã), Odete Rocha (artesã da empreita) e Pedro Piedade (oleiro), os artesãos que deram forma às peças agora em mostra.

«Os produtos que estamos a apresentar foram o resultado destes meses de trabalho. Depois das duas semanas de residência – uma de formação, outra de experiência – nós recolhemos muito material. Fomos para os nossos ateliers e estivemos mais umas semanas em projeto. Depois fiquei só eu a tomar conta conta dos protótipos dos três. A Vanessa também vinha, sempre que conseguia», conta Henrique Ralheta.

«Foram meses de muito trabalho. Desistimos de algumas peças, outras até tiveram uma evolução que nos surpreendeu. E depois foi esta forma muito interativa de trabalhar, que este tipo de colaborações gera. É sempre um processo de diálogo. Houve uma efetiva  troca de experiências, aprendemos muito uns com os outros. Foi muito, muito enriquecedor», acrescentou o curador da residência «Designers de Loulé».

«O cobre foi, de facto, aquilo que mais nos surpreendeu e onde explorámos mais até onde conseguíamos  ir. Quando trocamos o atelier pela oficina, percebemos quão difícil é, por vezes, pôr em prática o que nós tínhamos imaginado no atelier. Mas isso também ajuda a melhorar a nossa ideia»,disse, por seu lado, Vanessa Domingos.

Também Hugo Silva foi acompanhando o processo de elaboração dos protótipos, mas à distância, uma vez que reside e trabalha em Londres, no Reino Unido.

«Foi difícil. Via as fotografias e nem sempre ficava com a ideia certa do que estava ali, do que era o objeto e os seus detalhes. Mas confiei no que o Henrique me dizia e tentámos chegar a uma conclusão. A parte de interação com os artesãos era fundamental e coube ao Henrique passar essa informação», contou.

Nesta fase, apenas existem os protótipos destas peças. Mas a comercialização poderá vir em breve. «Nos próximos dia nós vamos decidir quais serão os caminhos comerciais dos produtos. Temos algumas ideias, mas não podemos ainda abrir o jogo. Mas penso que dentro de dois meses deverá haver novidades», contou Henrique Ralheta.

Este desfecho seria ouro sobre azul, já que o objetivo destas residências artísticas é, precisamente, dar um novo impulso às artes tradicionais. Ou seja, dar-lhes um futuro.

 

Veja as fotos da inauguração da mostra dos produtos do «Designers de Loulé»:

Fotos: Hugo Rodrigues|Sul Informação

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