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A direção do Curso e o Grupo Executivo do Mestrado Integrado de Medicina da Universidade do Algarve apresentaram a demissão ao reitor João Guerreiro, por considerarem que um novo protocolo a ser assinado entre a UAlg e o Centro Hospitalar do Algarve (CHA) coloca em causa a sua autonomia na escolha de oradores especialistas.

Esta é uma componente que consideram «a base» deste curso, cujo método «é inovador», em Portugal, e isto colocaria em causa «a qualidade formativa do curso», defendem.

Os membros destes órgãos do departamento de Ciências Biomédicas e Medicina dizem que o protocolo determina perda de autonomia, alegação que João Guerreiro recusa liminarmente, adiantando que já decidiu «voltar ao protocolo original», o mesmo que vigora desde a criação do curso, em 2009.

O anúncio da demissão era para ter sido feito numa conferência de imprensa, marcada para a tarde desta sexta-feira, no Campus de Gambelas da UAlg, mas acabou por ser improvisada à porta deste polo da universidade.

João Guerreiro justificou, pouco depois, em conversa com os jornalistas, que impediu a realização da conferência por se tratar de algo «nunca antes visto», alegando que este tipo de iniciativas só podem ser agendadas através da reitoria ou pelo gabinete de comunicação.

No exterior do Campus de Gambelas, a diretora do Mestrado Integrado de Medicina Isabel Palmeirim disse aos jornalistas que, até agora, a decisão sobre os oradores a convidar era do órgão que encabeça e do Grupo Executivo.

A escolha tem vindo a recair em especialistas «por mérito próprio», baseada na qualidade, adiantou.

Mas, assegurou, à luz do novo protocolo, serão os diretores clínicos do CHA a decidir quais os médicos a seu cargo que irão participar em seminários na UAlg.

«Aquilo que o protocolo condiciona é que sejamos nós a escolher quem são esses especialistas. No fundo, pretende que submetamos ao CHA quais os especialistas que queremos e serão eles a escolher quem vai falar», assegurou Isabel Palmeirim.

Já João Guerreiro garante que isto não é verdade e que a universidade continua a ter a última palavra no que à escolha dos oradores convidados diz respeito, mesmo que as direções clínicas não aceitem que determinado especialista participe num destes seminários.

Os convites, disse, podem ser feitos diretamente aos especialistas, que lidarão com a instituição a que estão ligados. «Se houver alguma instituição que ache que alguém que convidemos não deve vir cá, passamos a outra instituição. Isto sempre foi assim», assegurou.

João Guerreiro admite que já possa ter acontecido ter sido solicitado determinado especialista ao CHA e ter sido enviada uma pessoa diferente. «Mas a direção tem todo o direito a recusar essa colaboração», afirmou.

 

Qualidade está em causa, diz direção demissionária

Uma perda da autonomia da direção «coloca em causa a qualidade dos oradores» e, por associação, do curso em si, pois esta é uma componente central do curso.

O curso de medicina da UAlg difere em muito dos cursos clássicos, existentes noutras universidades do país, defende a direção demissionária. A componente de oradores convidados é a base de todo o modelo.

Isto porque o «núcleo duro de docentes do Mestrado Integrado de Medicina é apenas de nove professores», quando numa faculdade de medicina tradicional o corpo docente é composto por muitos mais professores, entre os quais especialistas nas mais diferentes áreas.

«Nós é que temos a capacidade de escolher estes especialistas, porque nós é que sabemos o que queremos para os nossos alunos», defendeu. «Se me disserem que o “Manuel” é fantástico, eu tenho de o poder convidar para vir cá. Não posso estar sujeita a pedir ao diretor e ele dizer: Não, o “Manuel” eu não quero. Não gosto dele, não gosto da cor das calças dele. Isso é que não podemos aceitar», exemplificou.

O reitor da UAlg diz não compreender a posição da direção do curso, uma vez que, garantiu, nunca teve a intenção de acordar com o CHA uma diminuição da autonomia da universidade.

No meio desta disputa, estão os alunos, que já se reuniram com a reitoria e não ficaram satisfeitos com o teor do protocolo que lhes foi apresentado. Assim sendo, dizem apoiar a direção demissionária, embora adiantem que João Guerreiro mostrou abertura para corrigir a questão que está no centro da discórdia.

Os alunos juntaram-se, em peso, à porta da Universidade e mantiveram-se junto dos docentes, em sinal de apoio.

Também os médicos de Medicina Geral que têm acolhido e dado tutoria a alunos do curso nos Centros de Saúde da região se colocam ao lado da direção e admitem deixar de colaborar com a universidade, numa situação limite.

 

Seminários trazem centenas de oradores por ano à UAlg

A importância dos seminários e dos oradores convidados é mais percetível quando se conhece os números. Cada turma do Mestrado Integrado de Medicina (que são quatro, uma por cada ano de curso), assiste, normalmente, a quatro destes seminários por semana, com oradores distintos.

Assim, num ano, são mais de 400 os oradores externos que contribuem para a formação dos futuros médicos “made in” Algarve.

Vêm «de instituições de norte a sul do país e do estrangeiro» e, sempre que possível, são os mais reputados especialistas em determinada área, o tema de um determinado seminário.

O protocolo, nos termos em que a direção demissionária alega que será celebrado, apenas condicionaria a escolha de especialistas do CHA, mas, para Isabel Palmeirim, deixar de fora especialistas do CHA seria um cenário «agressivo para o hospital e mau para a região». «Penso que é muito, muito útil a interação entre a universidade e o hospital», considerou.

No que toca ao pedido de demissão, João Guerreiro salientou que é a si que cabe a decisão de aceitar ou não a demissão das direções do Curso e do Grupo executivo, ou de a «aceitar sobre determinadas condições», mas disse que ainda não tomou qualquer decisão.

Quanto à continuidade do Mestrado Integrado de Medicina, João Guerreiro diz que não quer que seja posta em causa por esta situação. João Guerreiro elogiou o curso e os resultados que foram obtidos até agora e reafirmou que medicina é uma das bandeiras da UAlg. «Só se isto tudo for mesmo para tentar acabar com o curso. Será?», questionou, sem esconder alguma irritação.

Já os docentes avisam que a sua eventual saída da direção poderá ter um impacto muito profundo na componente organizativa do curso e até colocar em causa a componente letiva.

Com a eventual saída da direção, «o trabalho organizativo fica posto em causa» e com ele todo o funcionamento do Mestrado Integrado em Medicina da UAlg, já que é preciso todo um trabalho de contactos e agendamento de colaborações externas, que «gasta mais tempo do que o de dar aulas» a Isabel Palmeirim.

 

Protocolo voltou a ser o mesmo, garantiu o reitor

À luz da polémica que surgiu, João Guerreiro disse que decidiu propor ao CHA a assinatura de «exatamente o mesmo» protocolo antes em vigor. Numa versão de trabalho ainda acrescentou «uma palavra, que não mudava nada», mas já a terá retirado.

Já a direção do curso queria que a questão da autonomia ficasse bem explícita no novo protocolo, alegando que tem havido disputa na interpretação do que está lá disposto entre os responsáveis pelo Mestrado Integrado de Medicina e os dirigentes do CHA.

À reitoria, propuseram a inclusão de uma cláusula que, consideram, garantia essa autonomia. «A universidade escolhe as pessoas, acorda com elas e comunica aos diretores de serviço», revelou Isabel Palmeirim.

Uma sugestão rejeitada por João Guerreiro, que considera que se trataria «de uma ingerência na gestão do hospital», pois permitiria à universidade impor a presença de determinado especialista, sem que os dirigentes do CHA tivessem uma palavra a dizer.

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