Um jogo de sedução, que se desenrola num restaurante/palco e onde a música de Mozart se funde com gastronomia são os ingredientes da «Opera Buffa» que as companhias belgas Laika e Muziektheater Transparant trarão a Faro em junho próximo. Don Giovanni é o anfitrião e o chef principal e é através do palato que este eterno sedutor irá tentar as almas e o estômago dos espetadores.
O espetáculo foi apresentado na sexta-feira no local que acolherá a iniciativa a 8,9 e 10 de junho, a Escola de Hotelaria e Turismo do Algarve, em Faro.
Os claustros deste antigo convento darão um enquadramento especial a uma peça que já começou a correr mundo, mas que terá na capital algarvia a sua estreia absoluta a nível nacional.
Cada uma das três apresentações da peça terá capacidade máxima para 200 espetadores. Estes são, também, convidados do jantar que irá ser servido. É durante este repasto que se desenrola a ação, pontuada por momentos de pausa, onde os comensais se podem dedicar a provar os pratos que lhe são apresentados, que também fazem parte do espetáculo.
Pensada para uma sala fechada, esta ópera terá um formato inovador na sua passagem pelo Algarve. Além de se desenvolver ao ar livre, terá também a aliciante de juntar a Orquestra do Algarve ao habitual trio de músicos que acompanha o elenco. Também os alunos e professores da EHTA darão um toque algarvio ao espetáculo.
A peça daquele que é considerado por muitos o maior génio musical de sempre serve de base ao espetáculo, mas não o define. Esta não poderá ser vista, avisou o diretor musical de «Opera Buffa» Jan Van Outryve, como uma apresentação da ópera Don Giovanni, mas sim como «um teatro musical», inspirado na partitura de Mozart. Ou seja, a música desta famosa obra está presente, mas foi muitas vezes adaptada e a ordem das árias alterada.
«Um bom exemplo é uma cena em que uma das personagens persegue Leporello (aio de Don Giovanni) com uma faca, que existe na partitura original, mas é quase sempre retirada, por ser demasiado engraçada. Pegámos na música relativa à primeira cena de luta de espadas da partitura original e adaptámo-la a esta cena», revelou Jan Van Outryve.
Este espetáculo está, de resto, longe de ser uma Ópera convencional. A vertente jocosa está presente na partitura original da obra de Mozart, que, na altura que a compôs, a classificou como Ópera Bufa, mas raramente é salientada e é até, muitas vezes, desencorajada por quem a leva a cena.
A história do sedutor, um tipo de personagem que normalmente ligamos ao nome Don Juan, está cheia de peripécias humorísticas, fruto dos ciúmes que desperta nas suas muitas amantes e, obviamente, no ódio que desperta naqueles que as desposaram ou a quem elas estão prometidas.
A companhia Laika, cujo cognome é Teatro dos Sentidos, há muito que trabalha o tema da arte relacionada com a gastronomia. Já tiveram diversas passagens pelo Algarve, sendo a mais marcante a inauguração do Teatro Tempo de Portimão. Também de registar uma residência artística na Fábrica da Cerveja, em Faro, há alguns anos.
Público é convidado a desfrutar de experiência bem diferente
Mais do que contar a história incidindo num ângulo pouco habitual, a forma como esta peça é apresentada em palco é que define a verdadeira diferença para o que é convencional. Os intérpretes são, ao mesmo tempo, os empregados que servem os espetadores, neste concerto-jantar.
Ou seja, os que assistem ao espetáculo fazem parte do cenário e estão, literalmente, dentro do palco. Não são convidados a cantar ou a tocar, mas participam no repasto preparado por Don Giovanni e a sua equipa, numa cozinha que também integra o cenário, com aberturas que permitem ao público ver a confeção dos pratos.
Uma ideia do que poderá ser este contributo dos chefs portugueses e dos seus pupilos foi dada na apresentação da iniciativa, na sexta-feira. O desafio lançado pelo co-diretor e criador da peça Peter de Bie era o de se criar uma ementa assente na ideia de um jogo de sedução. A partir daqui, criou-se aquilo que se pode considerar uma produção artística única.
As nobres instalações da Escola de Hotelaria algarvia ajudaram a criar o ambiente, mas as verdadeiras protagonistas foram as diferentes e originais iguarias que as diferentes equipas de alunos criaram para o evento. Sabores e cores fortes, como se quer a paixão, tão ligada à história que Mozart nos conta em «Don Giovanni».
Apesar de a peça só ser apresentada em Faro, a sua vinda à região é da responsabilidade da rede cultural «Movimenta-te», criada no âmbito da rede de cidades Algarve Central, que junta Faro. Loulé, Olhão, São Brás de Alportel e Tavira. «Quisemos concentrar a iniciativa num território e convidar todos os que aqui vivem a deslocar-se a Faro, para assistir», ilustrou o programador desta rede Giacomo Scalisi.
A diretora do Teatro Municipal de Faro Anabela Afonso fez mesmo questão de enaltecer as sinergias criadas entre diversas instituições, nomeadamente as autarquias envolvidas, a EHTA e também o Turismo do Algarve, sem as quais «de certeza que este espetáculo não seria possível de realizar».
Todas as fotos foram retiradas do site oficial da companhia Laika www.laika.be