O pequeno auditório do Teatro Municipal de Portimão (Tempo) encheu-se de multiculturalidade, na sexta-feira, 30 de setembro, com um seminário dedicado à reflexão sobre a imigração.
Na plateia, estiveram pessoas oriundas de países africanos, do Leste da Europa ou do Brasil, que ouviram e participaram no debate de questões que lhes são próximas, como as dificuldades de encontrar emprego ou de ser empreendedor, ou o retorno ao país de origem.
Com mais de nove mil estrangeiros a residir em Portimão e com «uma crise económica que surpreendeu todos, pensámos que era necessário refletir sobre a forma como os imigrantes estão a viver questões como a empregabilidade», começou por explicar Ana Figueiredo, presidente da Junta de Freguesia de Portimão, organizadora do seminário e que é a primeira Junta da região algarvia com um Centro Local de Apoio à Integração dos Imigrantes (CLAII), inaugurado em 2009.
Por isso, a autarquia desenvolveu o seminário intitulado «Imigração e Cidadania Contemporânea» e convidou especialistas que debateram dois grandes temas: «Imigração, crise e empreendedorismo» e «Imigrantes entre retorno, regulação e resistência».
Um dos pontos altos do seminário foi o relato de histórias de vida contadas na primeira pessoa, que começou com a apresentação de um vídeo que compilou os testemunhos de imigrantes que escolheram o Algarve como região de acolhimento e, depois, com dois imigrantes a contar in loco a sua experiência.
Vestida a rigor, com turbante e túnica amarela e brilhante, Rocky Ndaw, uma senegalesa de 44 anos, que desenvolveu um negócio de venda de artesanato da sua terra, acessórios (pulseiras, fios) e colocação de tererê (tranças), subiu ao palco para contar a sua aventura em Portugal.
A imigrante revelou aos participantes o seu percurso desde que decidiu sair do Senegal até à altura em que se tornou uma empresária de sucesso e montou uma banca no centro comercial Aqua Portimão. Arrancando algumas gargalhadas ao público que a ouvia, a senegalesa contou algumas peripécias que lhe aconteceram nos últimos anos como imigrante, mas também os problemas e barreiras que teve que ultrapassar.
«Trabalhei nas limpezas na PT e à noite estava no Picoas [em Lisboa], mas o dinheiro não chegava para tudo. Tinha de ajudar a família, juntar e ter dinheiro para mim. Acumulei três empregos e quase não dormia. Um dia fui ao médico e ele mandou-me parar», relembrou. «Disse-me que já não estava boa da cabeça».
Foi nessa altura que visitou Portimão e viu que era um bom local para iniciar o negócio das tranças. Iniciou o seu «negócio» a fazer tranças no banco do jardim, mas hoje já tem uma empresa, em sociedade com as filhas.
Foram as mulheres empreendedoras que levaram Frederica Rodrigues, da Organização Internacional para as Migrações (OIM), a apresentar um estudo, neste seminário, que demorou nove meses a ser elaborado.
As conclusões a que este estudo chegou é que a mulher empreendedora tem em média entre os 35 e os 44 anos, tem educação secundária e profissional, não tem nacionalidade, adquiriu experiência profissional no país, sendo que a maioria quer ficar a residir em Portugal. Os questionários foram realizados a 450 pessoas de Braga, Porto, Aveiro, Lisboa, Setúbal e Faro.
Segundo Frederica Rodrigues, a «maioria abriu um negócio pelo desejo de independência, pela realização pessoal, sendo que o aumento dos rendimentos só aparece como a terceira razão para criar um negócio. Outras mulheres abriram por necessidade, devido à falta de emprego».
Enfrentaram, porém, dificuldades como a falta de capital próprio e o difícil acesso à banca. Muitas optaram, por isso, por abrir pequenos negócios que não implicam o recurso a empréstimo, como nas áreas da beleza, dos serviços de apoio doméstico (costura, lavandaria, limpezas), comércio e hotelaria e restauração.
Rocky é um exemplo de uma mulher empreendedora como aquelas que participaram no estudo, mas nem todos os imigrantes podem dizer o mesmo.
É que o Algarve, depois de Lisboa e Vale do Tejo, é a segunda região do país que sofreu o maior aumento de imigrantes nos últimos cinco anos, mas, com a crise económica e a quebra na construção civil, que se acentuaram nos últimos anos, começaram também os problemas da falta de trabalho.
Os dados que Madalena Feu, diretora do Centro de Emprego de Portimão, apresentou no seminário não deixam margens para dúvidas. Tendo em conta as informações registadas naquele centro, que abrange os concelhos de Portimão, Silves, Lagoa e Monchique, sobre os imigrantes de países terciários, legalizados e com autorização para trabalhar em Portugal, o número de desempregados inscritos aumentou 57 por cento, entre 2005 e 2009.
«Muitas pessoas vieram para cá devido à falta de trabalho ou de condições de trabalho no seu país, por circular a informação que Portugal era um país em que a vida e o clima eram bons, onde era fácil obter a nacionalidade e a legalização para o trabalho e onde os salários eram altos», explicou Madalena Feu.
A maioria dos imigrantes eram pessoas de países pobres, com situações desfavorecidas, que queriam obter rendimentos rápidos, através de trabalhos com condições, para melhorar a sua vida e a dos seus familiares, e tinham intenções de ficar por pouco tempo.
Se em 2005 estavam registadas 631 pessoas imigrantes no Centro de Emprego de Portimão, em 2009 a fasquia chegou aos 1381. No entanto, em 2010 já foi sentido um decréscimo, segundo afirmou Madalena Feu, numa tendência que deverá continuar em 2011.
Vindos da Europa de Leste, Brasil e países africanos, estes imigrantes representam, na sua maioria, mão de obra pouco qualificada, que aceita trabalho precário, com um baixo salário e más condições, empregos recusados pelos ativos nacionais.
No geral, estes são desempregados de baixa duração, devido à pressão de arranjar trabalho, acumulando, muitas vezes, mais do que um emprego. «No entanto, agora já há imigrantes desempregados de longa duração por causa da crise», adiantou Madalena Feu. O que leva estas pessoas a considerar se não será melhor retornarem ao seu país ou a imigrar para outro local da União Europeia, onde não haja tanta dificuldade.
Quanto ao género, em 2005, havia mais mulheres inscritas, tendência que se inverte em 2011 (números até agosto), com 65 por centos de homens entre os desempregados imigrantes inscritos. A crise na construção civil terá sido uma das grandes motivadoras desta realidade.