Uma boa parte da área de intervenção do Projeto Life «Habitat Lince/Abutre», que está a ser desenvolvido em diversas zonas do sudeste do país como a Serra do Caldeirão, foi destruída pelos fogos que assolaram esta zona do interior algarvio em julho.
O incêndio que devastou mais de 26 mil hectares de floresta e mato não colocou em causa a continuação do projeto no Algarve, mas condicionará muito a sua expansão.
Segundo revelou ao Sul Informação Eduardo Santos, coordenador deste projeto promovido pela Liga para Proteção da Natureza (LPN), as áreas onde já está a ser feito trabalho no terreno não foram diretamente afetadas, mas um vasto território para onde o projeto se iria expandir ficou agora totalmente destruído.
«Este fogo afetou grandemente as potencialidades da região para acolher o lince-ibérico. No imediato, quase toda a região fica posta de parte para desenvolver trabalho», disse.
O projeto «Habitat Lince/Abutre», que representa um investimento de 2,6 milhões de euros e tem a importante chancela do Programa Life da União Europeia, pretende, por um lado, criar «condições de sobrevivência, alimentação e reprodução» para aquelas duas espécies em vias de extinção e, por outro, encetar parcerias com associações locais e proprietários para preservar a paisagem natural, ao mesmo tempo que se sensibiliza ambientalmente as populações e agentes económicos.
Na Serra do Caldeirão, o enfoque deste projeto vai para o lince-ibérico, já que o abutre «não ocorre com frequência» nesta zona. «É certo que na região que ardeu havia habitats muito interessantes. Muitas propriedades que íamos contactar em breve foram destruídas pelo fogo», revelou.
O projeto Life da LPN na Serra do Caldeirão é focado no lince, mas Eduardo Santos lembrou que esta espécie há muito não é vista nestas paragens e que os fogos «afetaram muitas outras espécies». «A erosão, caso não se tome as medidas necessárias muito rapidamente, bem como outras consequências dos fogos, podem ser muito graves», avisou.
Além do aluimento de terras, há a questão da escorrência de águas contaminadas «que vai afetar a qualidade da água», duas áreas que estão contempladas na linha de apoio extraordinária que o programa Proder vai abrir para apoio às ações de estabilização de emergência pós-incêndio que é necessário levar a cabo na Serra do Caldeirão.
Intervenções que serão fundamentais para o «Habitat Lince/Abutre», uma vez que um dos objetivos do projeto é garantir que os linces que sejam eventualmente inseridos neste local tenham alimento suficiente. A dieta deste felino endémico da Península Ibérica passa, essencialmente, pelo coelho-bravo, uma das espécies que sentirá as consequências dos fogos.
«Também havia outro tipo de ações que nos vemos agora impossibilitados de fazer naquela área. Estamos a fazer uma avaliação das principais patologias que afetam os predadores carnívoros na Serra do Caldeirão e que pudessem afetar o lince. Íamos fazer uma amostragem na zona que ardeu, que provavelmente já não faremos, uma vez que os animais que aí viviam ou morreram ou fugiram para outras zonas», disse.
Life não pode ajudar à recuperação da Serra, mas LPN não ficará parada
Lamentando que «não haja aqui oportunidades» do projeto Life que coordena contribuir para a recuperação imediata da Serra do Caldeirão, uma vez que «a reposição do coberto vegetal não faz parte da candidatura», Eduardo Santos lembrou que isso não impede que a LPN o faça.
«Estamos preocupados e vamos ver em que medida podemos contribuir para que esta área recupere o mais rápida e corretamente possível. Antes de tudo, há aqui uma questão de ordenamento e planeamento da floresta», considerou. Ou seja, é importante que se aproveite para reflorestar, mas de forma pensada e organizada, tarefa na qual «o Estado terá um papel fundamental».
Projeto Lince vai estar com a população de São Brás em outubro
Apesar do revés que o incêndio que começou na atraia representou, os responsáveis pelo projeto «Habitat Lince/Abutre» não baixam os braços. Em outubro, seguem as ações de sensibilização junto da população, desta vez em São Brás de Alportel. «Mais próximo da data de realização desta ação de esclarecimento vamos indicar o dia, a hora e o local», anunciou Eduardo Santos.
Nota: a foto é de Carlos Filipe de Sousa