O Ministério da Saúde está a «negociar a contratação de uma equipa de alto nível de ortopedia para vir para o Algarve». O anúncio foi feito no Algarve pelo secretário de Estado da Administração Interna Jorge Gomes que, apesar de se tratar de um assunto fora da sua esfera de competência, quis dar conta do trabalho de «reforço nos hospitais do Algarve» que o Governo estará a levar a cabo.
Esta intenção é revelada poucos dias depois de se ter atingido a data de 31 de Maio, apontada em Março pelo ministro da Saúde Adalberto Campos Fernandes como o prazo para «resolver a maioria dos problemas do Serviço Nacional de saúde, no Algarve».
Apesar de terem sido tomadas algumas medidas e da Administração Regional de Saúde do Algarve considerar que foram ultrapassadas as «dificuldades inaceitáveis» então identificadas pelo ministro da Saúde, este argumento não parece pesar na opinião de médicos, enfermeiros e autarcas, muito menos da oposição. A opinião transversal é que muito pouco mudou, desde Março.
Um dos principais problemas identificados prende-se com a escassez de ortopedistas, que tem obrigado, em diversas ocasiões, a transferir utentes para outros hospitais, fora da região, por falta de capacidade de resposta.
Talvez por isso, Jorge Gomes fez questão de deixar esta mensagem na cerimónia de assinatura de um protocolo entre a AMAL e a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, esta segunda-feira. À margem da sessão, o membro do Governo excusou-se a concretizar a sua referência a uma «equipa de ortopedistas de alto nível», mas salientou os esforços do ministro da Saúde «para reforçar os hospitais do Algarve com várias equipas, para esta época [Verão]».
Estas diligências eram já conhecidas e foram o tema central de uma visita realizada pelo secretário de Estado da Saúde Manuel Delgado ao Algarve, em Maio. O membro do Governo anunciou a chegada à região de 30 médicos de família, em Junho, que serão colocados nos ACES Barlavento e Central.
Na altura, Manuel Delgado também admitia a possibilidade de «virem ao Algarve equipas de cirurgiões e anestesistas de Lisboa, em determinados períodos da semana, que consigam, durante dois ou três dias, operar doentes programados que estejam à espera» de tratamento.
Ao mesmo tempo, anunciou o avanço de «soluções excecionais que podem ajudar a resolver o problema [da falta de médicos]», que acabaram por ser concretizadas pelo Despacho n.º 7222-A/2016, publicado na passada semana (1 de Junho).
O Ministério da Saúde vai permitir que médicos de outras regiões se voluntariem para passar uma temporada no Algarve, recorrendo à mobilidade parcial, prevista na Lei. A adesão a esta medida é voluntária e os médicos interessados poder-se-ão candidatar assim que seja anunciada pela Adminsitração Regional de Saúde do Algarve a lista de necessidades prioritárias da região.
Entretanto, a ARS do Algarve assegura que não esteve parada e que têm sido tomadas medidas que permitiram ultrapassar «as dificuldades inaceitáveis» vividas pelo SNS do Algarve.
Entre elas contam-se «a abertura de 30 vagas de colocação de especialistas em Medicina Geral e Familiar e o regresso à atividade no Serviço Nacional de Saúde de médicos aposentados», bem como os protocolos assinados entre a Ortopedia do CHA, o Centro Hospitalar Lisboa Norte (CHNL), o Centro Hospitalar Lisboa Central e o Centro Hospitalar de Setúbal, «para apoio à Urgência do Algarve, dois dias por semana», e «na especialidade de Oncologia Médica entre o CHA e o CHLN, para o envio de uma equipa de especialistas para a unidade hospitalar de Portimão».
«A ARS deu ainda orientações ao CHA para, em situações excepcionais e de emergência, recorrer à contratação de serviços de ortopedia dos hospitais dos setores privado e social do Algarve para encaminhamento imediato de doentes», acrescentou esta entidade, questionada pelo Sul Informação.
Ao nível dos Cuidados de Saúde Primários, a ARS salientou a abertura da USF Descobrimentos no Centro de Saúde de Lagos (ACES Barlavento), «a 10ª USF da região, que vai abranger cerca de 10 mil utentes do concelho de Lagos, dos quais 9 mil não tinham médico de família atribuído». «Está prevista a abertura de mais três USF no Algarve no decorrer do ano de 2016», acrescentou o instituto público.
Sem reforço dos recursos humanos, problemas do SNS do Algarve mantêm-se
A falta de recursos humanos, no Serviço Nacional de Saúde, no Algarve, é um problema há muito identificado pelas diferentes classes profissionais, a administração hospitalar, o poder local e o poder central, o principal problema é a falta de recursos humanos. E o que foi feito, nesta área, desde arço é visto como insuficiente, para colmatar as (grandes) dificuldades existentes.
Tanto médicos como enfermeiros veem a contratação de mais colegas como o primeiro passo a ser dado, algo que ainda não aconteceu. Da parte dos médicos, terá mesmo havido uma intenção de demissão em bloco dos diretores de serviço, como forma de pressão ao Governo para acelerar a admissão de novos clínicos. Segundo o jornal Público, o novo Conselhod e Administração conseguiu travar as demissões e o Governo diz estar «a procurar resolver» este problema, nomeadamente o da falta de ortopedistas, a situação considerada mais grave.
No que diz respeito aos enfermeiros, a situação não é muito diferente. «O principal problema é a falta de recursos humanos e continua por resolver. Não se conseguem fazer omeletes sem ovos», resumiu o dirigente regional do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses Nuno Manjua ao Sul Informação.
Os representantes dos enfermeiros reuniram há poucos dias com o Conselho de Administração do CHA, que disse já ter solicitado à tutela «autorização para contratar enfermeiros», estando atualmente «à espera de autorização». Entertanto, já havia sido lançado um concurso para admissão de enfermeiros para os Cuidados de Saúde Primários, que «terá de ser anulado e reaberto», devido a problemas que surgiram
O presidente da AMAL – Comunidade Intermunicipal do Algarve, o socialista Jorge Botelho, admitiu ao Sul Informação que «foram dados alguns passos», mas que «ainda há muito para fazer», uma vez que «a situação não mudou muito e está aquém daquilo que nós esperávamos». «A verdade é que continuamos com falta de médicos, enfermeiros e técnicos de diagnóstico. Também continua a haver problemas nas cirurgias. Mas, pelo menos, a saúde do Algarve deixou de ser notícia todos os dias, pelas piores razões», disse.
«Temos de fazer uma avaliação rigorosa do que foi apresentado em Março e aquilo que foi feito. Vamos falar disso na nossa próxima reunião [dos 16 presidentes de Câmara do Algarve, na segunda-feira]. Houve um compromisso claro e com datas», acrescentou. Depois disso, vão querer falar com a tutela.
Já a oposição, nomeadamente o PSD, não hesitou em pedir satisfações a Adalberto Campos Fernandes, como o próprio pediu, quando esteve em Faro – «olhem para o que eu faço e não para aquilo que eu digo», disse o membro do Governo, na altura.
O deputado do PSD eleito pelo Cristóvão Norte aceitou o repto e confrontou o ministro, na Assembleia da República, defendendo que, «infelizmente, o precipitado compromisso ficará por cumprir: não temos mais médicos, temos menor orçamento, menos actos médicos, mais demissões nos serviços. Ou seja, temos mais descontentamento dentro dos hospitais e menos “cá fora”, já que quem está hoje na oposição faz as coisas sem criar alarmismo».
Em causa, alegou, está «a vaga de demissões e corte de orçamento», que «não levam o problema crónico da saúde no Algarve mais perto da solução».