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«Não pode ser que a gente ao fim de semana não tenha uma via para ir a lado nenhum», criticou a D. Maria José, do Chão das Donas, resumindo o sentimento da população das localidades periféricas do concelho de Portimão que, a partir de amanhã, sábado, deixam de contar com autocarros dos transportes urbanos «Vai e Vem».

A D. Maria José era uma das quarenta pessoas que ontem à tarde, entre as 16h30 e as 17h30, se reuniram no Clube Recreativo do Chão das Donas para ouvir as explicações por parte dos responsáveis e técnicos da empresa municipal Portimão Urbis sobre as profundas alterações que o serviço de transportes urbanos do concelho vai sofrer a partir de amanhã, para reduzir os seus custos anuais de 4,3 milhões de euros para 1,8 milhões.

O corte nos serviços do Vai e Vem, além de consequências para a população, que passará a ter menos autocarros e ficará, na maioria dos casos, sem serviço ao fim de semana e à noite, resultará ainda no despedimento de 35 a 40 dos atuais 96 motoristas da empresa Frota Azul, afetos ao Vai e Vem. Estas duas situações combinadas levaram à convocação de uma manifestação para esta tarde, pelas 14h30, frente à Câmara de Portimão.

Algumas das pessoas que ontem participaram na sessão no Chão das Donas garantiram, em declarações ao Sul Informação, que vão estar presentes na manifestação. «Isto é uma aldeia que não tem aqui nada. As pessoas precisam de continuar a ter um transporte ao fim de semana, ao sábado para ir à praça a Portimão, ao domingo para ir à missa ou ao hospital visitar algum familiar», defendeu, por seu lado, a D. Celeste Parreira.

«Não há direito: primeiro deram tudo e mais alguma coisa às pessoas, sem pensar no dinheiro que isso custava. Agora, de repente, tiram-nos quase tudo», lamentou José dos Santos Guerreiro. «Passa-se do 80 ao 8», disse uma senhora.

As alterações no Vai e Vem, que reduz o serviço das atuais 17 linhas, 565 paragens e 44 viaturas, para 14 linhas, 395 paragens e 22 viaturas, tem ainda como principal consequência o corte da maioria das linhas ao fim de semana. «Nós aqui no Chão das Donas, como estamos ao pé da EN125, ainda podemos usar os autocarros da carreira [interurbanos], mas o que é que podem fazer as pessoas das Alfarrobeiras, por exemplo? Quem não tiver carro ou uma boleia, não pode sair de lá ao fim de semana!», lamentava outra das participantes da reunião.

 

Os três critérios na base da «reformulação» do Vai e Vem

 

Do lado das explicações, estava Luís Manata, administrador da empresa municipal Portimão Urbis, que gere, pelo lado da autarquia, o serviço de transportes urbanos.

Luís Manata explicou que a «reformulação» do Vai e Vem teve por base três critérios: «a necessidade de reduzir substancialmente o custo do serviço em três milhões de euros anuais, garantir que as escolas sejam todas cobertas pelos transportes públicos urbanos e acabar com as linhas que têm uma média abaixo das cinco pessoas transportadas por viagem».

«O principal consumo do serviço do Vai e Vem é durante a semana, e isso fica assegurado. Os alunos continuam a ter transporte para irem para a escola, as outras pessoas têm transporte assegurado para se dirigirem aos serviços públicos, às consultas do Centro de Saúde ou do Hospital. O fim de semana é de facto o principal sacrificado, mas é de facto quando há menos gente a procurar o serviço», explicou, no fim da sessão, em declarações ao Sul Informação.

Mas então porque não espaçar mais as carreiras ao longo da semana – «passar dos atuais de 40 em 40 minutos, para um autocarro em cada hora e meia ou duas horas», como sugeriu uma das senhoras presentes na reunião do Chão das Donas – e garantir assim algum serviço ao fim de semana?

O administrador da Portimão Urbis explica que isso foi tentado, nas negociações com a Frota Azul, que assegura o serviço, mas não foi possível, porque «mesmo que haja só duas ou três viagens a funcionar em cada linha ao fim de semana, isso significa que tem que haver um motorista e um autocarro de serviço ao sábado e ao domingo. Ou seja, o custo está lá, mantém-se».

Outra ideia defendida pelos moradores das localidades periféricas do concelho de Portimão é que os passes do Vai e Vem sirvam também para os transportes interurbanos (Lagos-Portimão ou Monchique-Portimão, por exemplo), já que ambos são operados pela mesma empresa transportadora, a Frota Azul. Em algumas das zonas, como na Mexilhoeira Grande, Chão das Donas ou Rasmalho, o recurso aos autocarros interurbanos poderia ser uma solução.

De facto, até ao fim do mês de março, os passes do Vai e Vem servem nas outras carreiras, mas depois isso acaba.

«Não foi possível que a Frota Azul aceitasse isso em permanência. Por isso, o que estamos a negociar agora é um tarifário intermediário para quem tem passe do Vai e Vem, que permita reduzir os custos para essas pessoas nos transportes interurbanos», explicou Luís Manata.

 

Portimão Urbis tenta montar projeto-piloto para populações isoladas

 

O administrador da Portimão Urbis anunciou ainda que a empresa municipal está a tentar montar um projeto-piloto que possa garantir, através do recurso a táxis e carrinhas, o transporte de pessoas nas zonas mais periféricas, «para uma ida ao médico ou a um serviço público». «Isso sairia muito mais barato que os autocarros e faz-se em toda a Europa. Mas em Portugal, devido às restrições da legislação, não é possível. Mas estamos em reuniões com as entidades oficiais, para ver como podemos montar esse sistema, que permitisse, a pedido, ir buscar as pessoas mais isoladas».

Luis Manata admitiu, perante as quarenta pessoas presentes na sede do Clube Recreativo do Chão das Donas, que «a reformulação prejudica efetivamente as pessoas e o fim de semana é o mais penalizado, porque anda menos gente no Vai e Vem». Mas, sublinhou, quando as vozes dos populares se elevaram um pouco mais, em protesto, «há dois dias que não faço outra coisa que não seja tentar explicar às pessoas porque é que não pode haver carreiras do Vai e Vem ao fim de semana».

A D. Teresa, dirigente do Clube Recreativo do Chão das Donas, lamentou que todas as alterações não tivessem sido discutidas antes com a população e expressou o desejo que de «alguma coisa ainda possa ser corrigida, para não prejudicar tanto as pessoas».

Luís Manata explicou que «este contrato foi negociado com a Frota Azul por um ano e pode ainda haver alguns ajustes. Mas não vou dizer que esses ajustes passarão por repor o serviço ao fim de semana. Isso não vai acontecer! É porque queremos ver como as coisas correm, para fazer eventuais pequenos ajustes, que a reformulação entra em vigor amanhã [sábado, dia 16], primeiro dia das férias escolares. Há ainda alguma margem para pequenos ajustes que se possam mostrar pertinentes. Mas no dia 2 de abril, quando as aulas recomeçarem, já vai estar tudo a funcionar de forma definitiva».

Tal como nas restantes sessões de informação que esta semana têm percorrido as freguesias de Portimão, a contestação aos cortes no Vai e Vem esteve em alta e a maioria dos participantes (até pela hora) eram reformados e idosos.

As sessões já passaram pelo Clube Recreativo e Desportivo da Pedra Mourinha, Clube de Instrução e Recreio Mexilhoeirense, Associação Cultural e Desportiva da Ladeira do Vau, Clube de Futebol Montes Alvorense e Clube Recreativo do Chão das Donas. Hoje, sexta-feira, entre as 16h30 e as 17h30, a última sessão terá lugar na Junta de Freguesia de Portimão.

Amanhã, sábado, dia 16, entre as 9h00 e as 12h00 do próximo sábado, vai também funcionar no Mercado da Av. S. João Deus um  balcão de informação sobre o Vai e Vem, onde os interessados poderão obter os esclarecimentos que pretendam.

No Chão das Donas, foram recolhidas assinaturas num abaixo-asssinado contra as alterações no Vai e Vem, que os seus promotores querem entregar ao presidente da Câmara Manuel da Luz. Já a sessão estava quase no fim quando uma senhora de idade, de bengala, entrou e disse: «hoje estou revolucionária. Onde é que posso pôr a minha assinatura contra estes cortes?». Esta senhora é uma das utentes do Vai e Vem que garante ir participar, esta tarde, na manifestação à porta da Câmara de Portimão contra os cortes no serviço e os despedimentos que implica.

Estes cortes, a que a Câmara de Portimão prefere chamar «reformulação» , resultam da necessidade de a autarquia reduzir em 4,1 milhões de euros as despesas com o Vai e Vem, para cumprir as metas do Plano de Ajustamento Financeiro em curso no município, e que decorrem da candidatura da autarquia ao PAEL (Programa de Apoio à Economia Local).

 

O que muda no Vai e Vem?

Na prática, o serviço de transportes urbanos vai passar das atuais 17 linhas, 565 paragens e 44 viaturas, para 14 linhas, 395 paragens e 22 viaturas.

Sempre que possível será garantida a articulação com o serviço interurbano rodoviário e ferroviário. Aos fins de semana e feriados haverá apenas três linhas a operar e no verão (de 1 de julho a 31 de gosto) está prevista uma linha noturna todos os dias.

Nos dias úteis, todas as linhas têm serviço das 7h00 às 20h00, sendo consideradas horas de ponta os períodos das 07h00 às 10h00 e das 17h00 às 20h00.

Os percursos foram reorganizados para garantir estabelecer as ligações entre o centro de Portimão e áreas escolares e de serviços, zonas de praias, zonas ribeirinhas e entre Portimão e Penina, Montes de Alvor, Alvor, Bemposta, Alfarrobeiras, Ladeira do Vau e Companheira.

No que toca à Mexilhoeira Grande, a oferta é «reduzida significativamente», assegurando-se contudo o transporte escolar e as principais horas de deslocação da população, que tem como alternativa a linha interurbana Lagos-Portimão.

Na prática, das 14 linhas que se mantêm, sete servem a freguesia de Portimão, seis a de Alvor e uma a da Mexilhoeira Grande.

sulinformacao

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