O economista e conselheiro de Estado Vítor Bento considera que a “produtividade” e criar “condições para o investimento” são os passos de um caminho que o país tem de percorrer para sair da crise, sabendo de antemão que o passado recente é de um endividamento galopante que teve uma única exceção.
“O modelo que temos hoje é assente no consumo – em gastar mais do que o que se tem… O Estado Novo foi a única altura em que a dívida reduziu: aliás, Salazar é um dos responsáveis pelo nosso Estado Social”, disse o economista, numa conferência esta terça-feira, sobre “Crise e Ajustamento”, na Universidade do Algarve.
Vítor Bento, que terá recusado o convite para ser o ministro das Finanças de Pedro Passos Coelho, explicou que o endividamento tem sido uma constante na história do País e reafirma que o segredo para a saída da crise de Portugal tem de passar pela produtividade.
“Esse tem de ser o nosso grande objetivo: a nossa produtividade horária é cerca de metade da média europeia. Mas devemos atuar também ao nível dos custos para manter o emprego. Há que reduzir o peso da despesa interna (e isso é o consumo), porque o investimento é necessário e já a está a ser reduzido, se calhar, até em demasia. Talvez ainda venhamos a pagar por isso…”.
Segundo o economista, “para aumentar o investimento é preciso garantir condições de rentabilidade a esse investimento, porque hostilizar o investimento é, neste momento, hostilizar e condenar o emprego – e o investimento tem sido algo hostilizado…”.
O atual presidente da SIBS e conselheiro de Estado considerou politicamente errado que Miguel Relvas tenha apontado o próximo ano como de regresso de Portugal aos mercados. “É algo que não interessa. Há muitas variáveis que não controlamos que determinam se Portugal volta ou não a financiar-se nos mercados – sem auxílio externo. Determinar uma data seria constituir um ponto focal para a especulação financeira”.
“Aquilo que é relevante é apenas saber se Portugal está, primeiro, a cumprir os objetivos a que se comprometeu com a assistência financeira e, segundo, se estas medidas estão a dar resultado ou não. Porque nisto, as autoridades europeias estão tão comprometidas como as nacionais”, disse Vítor Bento.
O economista adianta não ter – como nenhum outro economista – a fórmula mágica para o fim da crise. “O que precisamos é de produtividade, certo. Mas nós, os economistas, estamos para a produtividade como os biólogos estão para a vida. Eles sabem como funciona a vida, sabem identificar os identificar vida, mas não podem criá-la. Nós, economistas, sabemos identificar e analisar a produtividade, sabemos o que a favorece, mas não sabemos criar produtividade”.
“Apontar caminhos, por isso, é uma questão de fé. Há os mais otimistas e os menos otimistas – e eu até sou dos mais otimistas – mas é apenas uma questão de fé. O resto ninguém sabe: há demasiadas variáveis em jogo”, concluiu Vítor Bento.
Segundo o otimista Vítor Bento, o futuro da União Europeia e do euro como o conhecemos é incerto, mas deverá ser assegurado para garantir a competitividade económica europeia e outros objetivos políticos. “A união monetária não está a funcionar, porque temos diferentes taxas de juro nos vários países. Mas o euro, sob o ponto de vista económico, não tem viabilidade: o euro tem de ser visto – como sempre foi – do ponto de vista político. E com objetivos de longo prazo: um é a paz na Europa, porque sempre houve – e não deixou de haver conflitualidade – na Europa. Outro é que na ótica da Economia Global, não há ninguém na Europa – nem sequer a Alemanha – que tenha dimensão para, por si só, competir com as restantes economias e ser um player a nível mundial. O que acontece hoje é isso: a Alemanha é relevante e viável pelo contexto e zona estável onde se encontra. Contrapartida é que a integração europeia se faz e fará com as regras da Alemanha”, diz o economista.