A incubadora de empresas criada no Parque Empresarial de Tavira vai receber o seu primeiro inquilino ainda durante o ano de 2012, revelou João Pedro Rodrigues, presidente do conselho de administração da Empresa Municipal Parques Empresariais de Tavira (EMPET), na sexta-feira, dia 23, na abertura da conferência «O Algarve e as Perspetivas Financeiras», a segunda do ciclo Ativar Tavira.
Ao que o Sul Informação apurou, e apesar de a EMPET não querer ainda divulgar qual é a empresa, tudo indica que se trata de uma empresa ligada à formação de pilotos de aviação.
A incubadora de empresas de base tecnológica, criada pela Câmara de Tavira em colaboração com o New Jersey Institute of Technology (NJIT), é um dos primeiros passos de uma nova estratégia para a economia não só do município, mas da própria região do Algarve, que os responsáveis tavirenses defendem.
Carlos Cano Vieira, professor da Universidade do Algarve e diretor científico do ciclo de conferências «Ativar Tavira», salientou, na abertura, que «estratégia não é só dizer o que se quer, que tenho estes objetivos no tempo. É também descobrir o que se pode fazer».
Vítor Neto, presidente da Associação Empresarial do Algarve (Nera), salientou, aliás, que o Algarve «é uma região sem estratégia de desenvolvimento económico e sem estratégia política». E isso, sublinhou, teve um papel fundamental na crise que atualmente se vive na região.
Por seu lado, Jorge Botelho, presidente da Câmara de Tavira, salientou, em entrevista ao Sul Informação, que «mesmo com a crise, há muitos empresários que querem investir, que têm ideias de negócio, mas que precisam de ser incentivados a fixar-se no concelho e no Algarve. É precisamente isso que deve ser feito, não só pelo Governo central, como pelas entidades regionais e pelas Câmaras Municipais». Mas, para isso, defendeu, «há que ter estratégia e visão. Não podemos estar todos de costas voltadas uns para os outros».
«Nos últimos 20 anos, a visão que tivemos para o Algarve foi de sol, mar e turismo com muita sazonalidade. Aceitámos isso, mas agora sabe-se que não chega. Há que fomentar e apoiar o investimento noutras áreas, há que pegar nos produtos tradicionais e acrescentar-lhes valor, há que apostar em novos produtos, em novas áreas. O imobiliário não é para acabar, mas temos que voltar aos setores tradicionais. Há, por exemplo, empresários do setor agrícola que querem diversificar os seus negócios».
«O que dizemos aos investidores é que em Tavira têm aqui, na Câmara Municipal, um parceiro sob duas formas: tentar quebrar a monotonia em que o Algarve se transformou e dinamizar a minha comunidade para sairmos desta interioridade em que nos colocaram», disse Jorge Botelho.
Não à taxa turística
Além da criação da incubadora de empresas e do relançamento do Parque Empresarial de Tavira, o autarca salientou a recente decisão de diminuir o IMI, cuja taxa «deixou de ser a mais alta do Algarve, e de acabar com a derrama sobre os resultados líquidos das empresas do concelho. «A Câmara de Tavira arrecadava anualmente 500 mil euros de receita com a derrama, mas prescindimos disso. É um contributo nosso para as empresas», anunciou o autarca.
Jorge Botelho garantiu ainda, na sessão de encerramento da conferência, que «não está prevista em Tavira a fixação da taxa turística [de um euro sobre cada dormida, proposta pela AMAL]. Não estamos a pensar novos impostos, antes pelo contrário, queremos manter ou mesmo reduzir os impostos municipais».
Este foi um anúncio que foi bem acolhido pela assistência, composta na sua maioria por empresários. Vitor Neto, presidente do Nera, já tinha antes criticado a ideia lançada pela AMAL de criar aquela taxa municipal. «O que as Câmaras deviam fazer é perguntar-se: o que podem os municípios fazer para estimular o turismo? Não é criar mais impostos».
«Andamos todos de costas voltadas, não há estratégia regional», lamentou o líder dos empresários algarvios.
Mar de potencialidades
Apesar de o tema da conferência ser «O Algarve e as Perspetivas Financeiras», não foi só de números que se falou.
André Dias, vice-presidente da Plataforma Maralgarve, apresentou os objetivos desta associação que se formou para dinamizar o cluster do mar e que integra entidades públicas, a universidade, autarquias e empresas.
André Dias salientou que o objetivo é precisamente criar relações entre as empresas ligadas ao mar no Algarve, dar apoio a empresas que se queiram instalar na região e, sobretudo, fomentar a atratividade da região para todos os novos negócios ligados ao mar – das pescas à aquicultura, da animação turística à energia, da cultura às infraestruturas, da náutica de recreio ao desporto, da construção naval à investigação ou mesmo aos novos produtos. «Há um mar de oportunidades para explorar», garantiu.
Sobre as potencialidades do mar que falta aproveitar, uma das pessoas na assistência sublinhou que «as infraestruturas náuticas nunca baixam de ocupação no Inverno, mantêm-se sempre pelo menos a 70 ou 80%, enquanto os hotéis à vezes fecham no Inverno».
Apesar disso, «estamos a deixar fugir os nautas para a Turquia, para a Grécia, porque Portugal não está a trabalhar nisso. A Associação Portuguesa de Portos de Recreio tem um projeto, fazendo a promoção da oferta portuguesa nas feiras náuticas, mas o Turismo de Portugal não promove este setor», acrescentou.
O mesmo membro da assistência sugeriu que o Parque Empresarial de Tavira «deveria tentar apostar nas empresas viradas para o mar» e defendeu a implementação, no concelho, de estações náuticas, um conglomerado de serviços e de ofertas à volta do mar. «É difícil construir uma marina ou um porto de recreio em Tavira, mas é fácil criar uma estação náutica», disse.
Uma marca forte para o Algarve
Vitor Neto, presidente do Nera, fazendo uma análise sobre a situação regional atual, sublinhou a perda de competitividade e de peso do turismo do Algarve não só no contexto internacional, como até a nível nacional. «Em 2001, o Algarve representava 50% das dormidas dos estrangeiros em Portugal e agora representa 39%. Perdeu 11% em dez anos e ninguém se interroga porquê e como inverter isso».
É que, sublinhou o empresário, «dirão que o Algarve, de 2001 para 2010, perdeu 3 milhões de dormidas de estrangeiros mas aumentou nas dos nacionais. Só que as dormidas dos estrangeiros são exportações e as dos portugueses são apenas consumo interno».
Vitor Neto defendeu que as causas da atual situação são os «erros de estratégia no turismo», esquecendo «os mercados tradicionais» e pensando «que o motor do crescimento seriam os grandes empreendimentos, os PINs, e o imobiliário». O resultado dessa política, defendeu, está à vista. E deu um exemplo: «a Lusotur, criada por André Jordan, está agora nas mãos de bancos de Estado de Espanha e da Irlanda, porque as empresas que compraram esse empreendimento e que eram oriundas desses países faliram e os seus ativos estão nas mãos dos bancos credores».
Mas, perante o cenário, o que propõe então? «Agarrarmos nos nossos recursos, nas nossas potencialidades e transformar isso em empresas. É preciso fazer o que já sabemos, mas voltar a fazê-lo melhor, exportar mais alfarroba, exportar mais figo, inovar na agroindústria, acrescentando a tudo isso a investigação que tem sido feita nas últimas décadas», responde Vitor Neto.
O que não se pode, defendeu, «é ter 16 Silicon Valleys no Algarve, 16 parques empresariais, onde todos estão de costas voltadas. É preciso voltar a discutir estes setores e integrá-los numa estratégia única».
Francesco Berretini, da empresa tecnológica Inesting, que começou no Algarve e já se expandiu para Lisboa e São Paulo (Brasil), sublinhou que «o Algarve tem que ter uma marca forte, para que não seja desvalorização que uma empresa tecnológica tenha aqui a sua sede».
De onde vem o dinheiro?
Com estratégia ou sem ela, a verdade é que o Algarve precisa de dinheiro, de investimento. António Ramos, secretário técnico do Programa Operacional Algarve 21, recordou que no próprio dia da conferência (sexta-feira, 23 de novembro) estava ser discutido em Bruxelas «o dinheiro que aí vem» no quadro comunitário 2013/2020.
A esperança é que o Algarve seja, neste novo quadro, «uma região de transição», mas isso, lembrou António Ramos, «ainda não está assumido». No entanto, se tal acontecer, será «a única região de transição do país». E será que esse estatuto trará mais dinheiro para a região? É difícil de prever, para já.
Em relação à Estratégia 2020 da Comissão Europeia, António Ramos sublinhou que «já não chega dizer que temos potencial, que podemos fazer. A Comissão Europeia quer ver no mercado aquilo que investiu nas universidades até agora». Ou seja, chegou à altura de passar das palavras aos atos e de concretizar em negócios as boas ideias que a investigação andou a explorar até agora.
Dinheiro vivo – ou talvez não – poderá também vir dos Business Angels, que são «investidores privados e informais de capital de risco», «indivíduos que têm alguma disponibilidade financeira para investir, mas que têm sobretudo capital de conhecimento».
João Pires, presidente dos Business Angels Algarve, explicou que o que estes anjos dos negócios fazem «não é um apoio, não é um financiamento, é um investimento de um indivíduo, com o seu dinheiro, que entra para o capital social de uma empresa e vai ser sócio e por vezes até vai trabalhar nessa empresa. Quem investe é particularmente exigente, porque vai lá por o seu dinheiro».
João Pires sugeriu: «pensemos as nossas ideias de negócio em torno do que o mercado quer». Esse é, concluiu, o segredo do sucesso. Parece simples, não é?
«Hoje está tudo mais ou menos estudado, por isso estamos na época do fazer. Temos que valorizar o que temos, temos que inovar e vender isso como produto», diria, a concluir esta conferência, Jorge Botelho, presidente da Câmara de Tavira.
A EMPET, no âmbito do seu projeto Ativar Tavira, está já a pensar a organização da próxima conferência, que será a terceira deste ciclo.