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A imagem não pode ser tudo

Quando li a crónica do antigo jornalista e diretor do jornal Record Alexandre Pais tecendo comentários sobre a imagem da Maria Botelho Moniz, apresentadora do programa da TVI «Dois às 10», e da Cristina Ferreira, pensei que fosse uma mentira de 1 de abril, um texto falso — não me pareceu verossímil que linhas com tanta imponderação sobre corpos de mulheres pudessem ser escritas, e muito menos, publicadas.

A liberdade de expressão não deve servir de escudo para opiniões vazias poluírem o olhar dos leitores.

Alexandre Pais é colunista do Correio da Manhã e podia aproveitar o seu espaço para falar sobre um abismo de assuntos, mas não. Decidiu entrelaçar vocábulos sobre o peso de Maria Botelho Moniz, a flacidez dos braços de Cristina Ferreira, indo ainda mais longe, dando, como exemplos de «cuidado e inteligência», Catarina Furtado e Sónia Araujo «que, após os 50, surgem sempre de silhueta perfeita e bem produzidas, em sinal de respeito por si e pelo público, e evitando que o inverno chegue mais cedo».

Em escassos parágrafos espelha-se todo o escrutínio existencial que uma mulher sofre ao longo da sua vida, só por ter nascido mulher, com mais brutalidade, se for figura pública: o peso, a forma física, a necessidade de estar «sempre perfeita» e o «problema» do envelhecimento.

Estes olhares furtivos e maledicentes não acontecem só a quem tem holofotes – e aí reside um dos grandes problemas. Cristina Ferreira poderá processar o colunista do CM, demonstrar o seu repúdio em público. Maria Botelho Moniz tem uma audiência que a apoia e acarinha.

Mas o que dizer de tantas mulheres anónimas que são vilipendiadas no silêncio do quotidiano? Que sofrem com comentários e comportamentos misóginos que afetam a sua autoestima, a sua saúde mental e, até, a sua progressão profissional?

A dor é a mesma, o estrago interno também, mas há algo de libertador no poder de responder publicamente (ou de permanecer em silêncio, mas sentir o apoio de muitos).

Numa outra fase da minha vida, quando trabalhava no Turismo, um dia, foi-me recusada uma oportunidade de progressão na carreira porque estava em «idade de engravidar».

Comentário dito assim, diretamente, por um homem que aparentava a mesma idade que eu. Um senhor diretor, a quem esta questão de ser pai nunca será um obstáculo. Ainda hoje, no ginásio, contaram-me o episódio de um indivíduo dos seus cinquenta anos que se recusa a receber ordens de mulheres.

Esta questão da importância da imagem da Mulher (ou, apenas, de Ser Mulher) está infelizmente, longe de ser ultrapassada.

O peso, a silhueta de um homem, a sua idade são «não-assuntos». Dificilmente, será dito a um apresentador de televisão para perder peso, definir abdominais, de modo a respeitar o público, ou disfarçar rugas, flacidez para que o inverno não lhe bata à porta.

A uma mulher, além do curriculum, do profissionalismo, das competências e capacidades, é quase exigido que resolva problemas, encontre soluções, encante o mundo com cabelos Babyliss, sorriso diamante e pernas que não descuram o vaivém da elíptica, de preferência de saltos altos, mas, cuidado, se forem daqueles de sola de couro vermelho brilhante.

Quanto a Alexandre Pais, a data que escolheu para partilhar estes impropérios, não poderia ser a mais indicada. 1 de Abril, Dia das Mentiras, dia dos tolos.

Não podemos permanecer indiferentes a estas realidades. Não podemos calar. Homens ou mulheres.

Já dizia Chimamanda Ngozi: «o problema do género é que ele prescreve como devemos ser em vez de reconhecer quem somos».

 

Autora: Analita Alves dos Santos é uma Mãe preocupada com questões ambientais… e não só

 

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