Esta tem sido a campanha para as Eleições Autárquicas mais cheia de casos, de quezílias, de crispação, de que me lembro. E eu já acompanho eleições há muitos anos, mesmo antes de ser jornalista.
A explicação para toda esta crispação pode estar no facto de o país se encontrar numa situação de grande dificuldade, repercutindo-se isso nas eleições, ainda que elas se destinem a eleger líderes locais e não nacionais.
Mas, mesmo a nível local, as quezílias têm sido muitas, a começar, desde logo, e há muitos meses, com a famosa questão da possibilidade de os autarcas saírem de um concelho onde já não podem candidatar-se mais nenhuma vez, para se apresentarem a sufrágio no concelho ao lado. A indefinição causada pelas diferentes interpretações da lei deu um mau espetáculo do mundo da política e da justiça aos cidadãos.
Todos estes casos e quezílias, a juntar à situação financeira muito difícil que a maioria das Câmaras Municipais vive, fazem com que a campanha esteja a ser mais cheia de ataques pessoais, às vezes mesmo de ofensas, que o normal em anos anteriores.
O facto de estas serem as primeiras Eleições Autárquicas em que as redes sociais e a internet desempenham um papel realmente importante em Portugal também não tem ajudado, paradoxalmente, a elevar o nível da campanha. Antes pelo contrário.
Sob o anonimato e a mediação extrema das redes sociais – em especial no Facebook -, muita gente tem dito e escrito coisas inconcebíveis. Coisas que não se atreveriam a dizer cara a cara e que antes nem sequer se atreveriam a escrever, por exemplo, num jornal impresso, porque, apesar de tudo, o ato da escrita levava mais tempo, dava azo a mais reflexão prévia…e certas coisas mais intempestivas, mais irrefletidas, nunca chegariam a ser publicadas.
O resultado de tudo isto é que pouco ou nada se discutiu de verdadeiramente importante para as pessoas. Não se falou de projetos, não se falou de propostas, não se falou de futuro – ainda que a palavra faça parte dos slogans de muitos candidatos, de todos os quadrantes políticos. As campanhas acabaram por ficar pelos fait divers, pelas guerrinhas de alecrim e manjerona, também muito por culpa da lei irrealista que, na prática, inviabiliza que os jornais, rádios e televisões façam uma cobertura noticiosa digna desse nome.
Por isso, só me resta esperar que, até domingo, no próprio domingo e nos dias que se seguirem, as coisas corram normalmente como devem correr num país que se diz democrático. E que a abstenção não seja, mais uma vez, a grande vencedora nestas eleições!
Este é o texto da crónica radiofónica que todas as quintas-feiras assino na Rádio Universitária do Algarve (RUA) e que pode ser ouvida em podcast aqui.