Os dois países ibéricos aderiram à União Europeia em 1986. Em 2016, comemoramos, portanto, 30 anos de integração europeia e cooperação transfronteiriça.
O programa INTERREG foi lançado em 1992 e as relações que o Alentejo, o Algarve e a Andaluzia mantêm desde então permitiram a formação de redes colaborativas que acabaram por constituir a pedra angular da Eurorregião AAA, criada a 5 de Maio de 2010 através da assinatura tripartida de um protocolo de cooperação.
Passados estes anos, a pergunta faz todo o sentido: criar uma Eurorregião do Sudoeste Peninsular, envolvendo o Alentejo, o Algarve e a Andaluzia, para quê?
Tentemos perceber o problema em toda a sua extensão, uma vez que todas as razões parecem apontar para a inércia e o statu quo das relações transfronteiriças que podíamos caracterizar como relações de baixo custo e baixa intensidade.
Sabemos que a Andaluzia tem 7,5 milhões de habitantes, o Alentejo e o Algarve juntos apenas um milhão. Sabemos que há uma manifesta desigualdade político-institucional entre as duas regiões portuguesas e a comunidade autónoma espanhola.
Sabemos que a dinâmica económica da Andaluzia não se compara com o Alentejo e o Algarve. Sabemos que em 30 anos de integração, Portugal teve 15 anos de convergência e 15 anos de divergência económica.
Sabemos que o período entre 2011 e 2015 foi um período atípico condicionado pelo programa da Troika que pôs em compasso de espera toda a cooperação transfronteiriça. Sabemos que não há, neste momento, pensamento, doutrina e estratégia para uma aventura a três no sudoeste peninsular.
Sabemos, enfim, que “um triplo A” para as regiões do Alentejo, Algarve e Andaluzia é uma “grande ilusão” e manifestamente exagerado como proposta para esta jovem comunidade territorial !!!
E no entanto.
Sabemos que a cooperação de proximidade é um recurso relativamente barato e abundante, que pode ser usado de forma inteligente e colaborativa pelos vizinhos.
Sabemos que a turistificação intensiva do sul da península merece mais e melhor atenção conjunta e atuação preventiva para evitar efeitos externos negativos sobre as regiões.
Sabemos que o Alentejo e o Algarve são também regiões de transição entre a área metropolitana de Lisboa e a área metropolitana de Sevilha, que é preciso conceber e organizar de modo mais imaginativo.
Sabemos, igualmente, que as três regiões formam uma comunidade de segurança coletiva, interna e externa, que, no futuro próximo, prevalecerá, muito provavelmente, sobre tudo o resto.
Apesar da sua grande relevância geopolítica e geoeconómica para a eurorregião AAA, não vou, desta vez, refletir sobre os impactos exteriores com origem nos grandes tratados transoceânicos (TPE e TTIP), no Brexit, nas primaveras árabes ou na turbulência da CPLP.
Desta vez, e por razões de espaço, limito-me a enunciar uma simples proposta de trabalho, tendo em vista criar inteligência coletiva, identidade e uma economia de rede colaborativa entre as três regiões AAA.
Só um programa de trabalho composto de projetos de mérito e reputação pode promover essa inteligência, essa identidade e essa colaboração. Aqui vai o meu contributo.
1. Uma IGP-AAA
Uma indicação geográfica de proveniência para o território AAA e para os produtos das agriculturas de nicho produzidos nos parques naturais das três regiões e certificados pela Eurorregião;
2. Uma rede de extensão empresarial AAA
Uma rede de extensão empresarial para os parques empresariais da região transfronteiriça e uma unidade de estágios profissionais para colocar jovens licenciados em empresas dos dois lados da fronteira.
3. Uma plataforma interuniversitária AAA de pós-graduação
A criação de uma pós-graduação e mestrado entre as universidades de Évora, Algarve e Huelva, com extensão a Sevilha e Extremadura, com titulação conjunta e certificação pela Eurorregião.
4. Um programa AAA de acessibilidade e mobilidade (via verde) para doentes de risco
Uma plataforma tecnológica de colaboração entre unidades de saúde pode facilitar a mobilidade e o acesso dos doentes de risco tendo em vista reduzir substancialmente os tempos de espera destes doentes.
5. Um programa AAA para a prevenção e o treino dos grandes riscos
No caso das alterações climáticas, em especial, creio que se justifica a criação de uma unidade especial transfronteiriça de prevenção e treino de grandes riscos.
6. Um programa AAA de eventos de grande prestígio internacional
A título meramente indicativo, e no contexto mais emblemático do Baixo Guadiana, creio que faz sentido propor: uma prova de triatlo, uma prova de canoagem e uma prova de BTT.
7. Um programa AAA para a reabilitação da ecologia da paisagem do rio Guadiana
Dado o estado de abandono em que se encontra, faz sentido, em minha opinião, a criação de uma “residência permanente” para a ecologia da paisagem e as artes da paisagem, que servirá de suporte à realização de uma Bienal de Artes da Paisagem no Baixo Guadiana.
8. Uma comunidade AAA de segurança interna e externa
A criação de uma plataforma colaborativa tecnológica que suporte o funcionamento operacional em rede das forças policiais e de segurança e os tribunais na prevenção e combate em matéria de segurança interna e externa.
9. A identidade AAA nas escolas e na comunidade eurorregional
A criação de uma plataforma colaborativa tecnológica para as escolas da eurorregião com programas temáticos de divulgação e recreio e um programa de eventos culturais e artísticos com participação dos artistas locais das três regiões.
10. Uma via verde AAA
A criação de uma via verde AAA, um cartão universal de acesso e mobilidade e com valências de diversa ordem com fins múltiplos.
Autor: António Covas
Professor catedrático da Universidade do Algarve
Doutorado em Assuntos Europeus pela Universidade Livre de Bruxelas