O FMI veio esta semana deitar um balde de água fria no entusiasmo do Governo, que já andava a embandeirar em arco com a alegada boa performance da economia portuguesa. É que o FMI disse, no seu relatório da 10ª avaliação, que o ajustamento externo da economia portuguesa está a ser feito não porque há um efetivo crescimento, mas à custa da diminuição das importações e do acréscimo das exportações de combustíveis. E isso, sublinhou o FMI, são fatores que poderão ser insustentáveis, ou seja, poderão não ter pernas para continuar.
Segundo o FMI, se houver alguma retoma no consumo dos portugueses, as importações começarão de novo a subir, ao mesmo tempo que o turismo, que em 2013 teve um ano excecional, poderá não conseguir repetir essa performance. E tudo isso põe em causa a manutenção do crescimento da economia portuguesa, com base nas exportações.
O aumento das exportações, que tem sido apontado, pelo Governo, como a grande vitória da economia portuguesa nesta era da intervenção da troika, fica assim exposto na sua fragilidade. E isto logo no dia a seguir a Paulo Portas, vice primeiro-ministro, ter dito que as exportações são o «porta-aviões da recuperação». Como escreveu o Jornal de Negócios, foi um tiro do FMI, em cheio, no porta-aviões do Governo…
Há dias, o ministro da Economia também tinha falado, eufórico, em «milagre económico», uma euforia que até o primeiro-ministro Passos Coelho renegou, no último debate parlamentar, ao recusar, perante as acusações de António José Seguro, que um membro do Governo alguma vez tivesse proferido tais palavras.
O ministro da Economia Pires de Lima, que me parece ser pessoa mais ou menos sensata, já veio a público admitir ter exagerado quando usou a expressão «milagre económico». Mas, ainda assim, não desarmou totalmente o seu discurso e defendeu ser preferível exagerar nos elogios às empresas do que desvalorizar os sinais da retoma económica.
Retoma económica? O FMI também disse, no seu relatório da 10ª avaliação ao programa de ajustamento, que Portugal tem níveis de desemprego «inaceitáveis», sobretudo no que diz respeito ao desemprego jovem, que atinge 37%. E este é mais um tiro no porta-aviões da euforia do Governo.
No meio de tudo isto, é preciso não esquecer que, em maio, há eleições para o Parlamento Europeu, e que, em 2015, haverá Eleições Legislativas, que Passos Coelho sonha ganhar…e isso explica muitos dos excessos de linguagem em que os partidos e as pessoas ligadas ao Governo se vão empenhar nos tempos mais próximos, tentando negar a evidência que entra pelos olhos dos portugueses: que, se há retoma, ainda ninguém notou no seu dia a dia.
Este é o texto da crónica radiofónica que todas as quintas-feiras assino na Rádio Universitária do Algarve (RUA) e que pode ser ouvida em podcast aqui.