Quem pensava que o caso Viga d’Ouro estava morto e esquecido, engana-se. O executivo CDU da Câmara de Silves encomendou uma auditoria financeira externa às contas do Município e quer agora avançar com um processo judicial contra os dois anteriores presidentes, Isabel Soares e Rogério Pinto, ambos do PSD.
Mas, porque o executivo comunista não tem maioria na Câmara, as propostas da presidente Rosa Palma acabaram por ser rejeitadas e por motivar (mais) uma azeda troca de acusações.
Segundo revela o executivo permanente da Câmara de Silves, em comunicado público, «a auditoria financeira permitiu revelar a prática de várias irregularidades durante os mandatos em que foram Presidentes da Câmara Municipal de Silves a Dr.ª Maria Isabel Fernandes da Silva Soares e o Dr. Rogério Santos Pinto (ambos eleitos pelo PSD), designadamente na contratação pública de serviços, por ajuste direto, à empresa de construção civil “Viga D´Ouro” e à firma de advogados “PLMJ”».
Rosa Palma: «a auditoria financeira permitiu revelar a prática de várias irregularidades durante os mandatos em que foram Presidentes da Câmara Municipal de Silves a Dr.ª Maria Isabel Fernandes da Silva Soares e o Dr. Rogério Santos Pinto (ambos eleitos pelo PSD)»
Tendo em conta essas alegadas irregularidades, o executivo presidido por Rosa Palma queria agora enviar o relatório de auditoria para o Tribunal de Contas, «para instrução do processo já em curso de apuramento de responsabilidades financeiras», bem como à Assembleia Municipal de Silves, «para tomada de conhecimento do seu teor».
Pretendia também «encarregar o executivo municipal permanente (CDU) de avaliar, em termos jurídicos, a possibilidade de acionar judicialmente os eleitos locais de anteriores executivos diretamente envolvidos no processo “Viga d´Ouro”, com fundamento em responsabilidade civil».
O objetivo seria «possibilitar o ressarcimento dos prejuízos causados ao erário público municipal», isto «sem prejuízo do que entretanto viesse a ser apurado e decidido pelo Tribunal de Contas, no âmbito dos seus poderes de averiguação de responsabilidades financeiras de titulares de cargos públicos».
Mas os vereadores do PSD (Rogério Pinto e Graça Neto) e do PS (Fernando Serpa e Paulo Pina), que juntos têm a maioria, votaram contra. Sobretudo porque os vereadores da oposição consideram que há «aproveitamento político» na revelação dos resultados da auditoria a poucos dias das Eleições Legislativas, já que, acusam, o relatório estaria na posse do executivo de Rosa Palma desde Fevereiro passado.
No entanto, no seu comunicado, o executivo da CDU não fala desta coincidência temporal e salienta que «lamentavelmente, a conduta adotada pela vereação não permanente (PS e PSD) mostra-se inconciliável com a transparência da gestão pública autárquica, a defesa intransigente do erário público municipal e o apuramento efetivo de responsabilidades de eleitos locais no âmbito do processo “Viga D´Ouro”».
E garante que «não deixará de defender» todas essas questões, «porque está em causa o interesse público e a legalidade».
Isabel Soares e Rogério Pinto, os ex-edis social-democratas postos em causa pelos resultados da auditoria externa, afirmam-se tranquilos. Isabel Soares salienta que «na altura devida, tudo foi esclarecido e encaminhado para as entidades competentes», enquanto Rogério Pinto recorda que «o processo judicial foi arquivado em devido tempo, depois de ter sido feita uma auditoria, e depois de a própria presidente, à data Isabel Soares, ter chamado as autoridades e entregue toda a documentação para ser auditada».
De facto, quanto a eventuais responsabilidades de Isabel Soares, em Abril de 2012, o processo por abuso de poder contra a autarca social-democrata e dois outros vereadores foi arquivado.
No que diz respeito às novas acusações resultantes da auditoria externa, Isabel Soares e Rogério Pinto estão ainda a ponderar que atitude tomar face às acusações de voltaram a ser alvo.
Concelhia do PS/Silves: «o Partido Socialista apresentou uma proposta no sentido de respeitar o direito ao contraditório, princípio basilar do nosso direito, relativamente aos visados no relatório, enquanto se aguarda para breve, segundo a Sra. Presidente, o envio pelo Tribunal de Contas do relatório final da investigação às contas do município»
Por seu lado, o vereador socialista Fernando Serpa, advogado, defende o voto negativo dos dois eleitos do PS com a necessidade de garantir «o direito ao contraditório por parte dos dois autarcas visados».
Ana Sofia Belchior, presidente da Comissão Política do PS de Silves, divulgou ontem um comunicado em que explica melhor esta posição, salientando que «assumindo uma posição construtiva, o Partido Socialista apresentou uma proposta no sentido de respeitar o direito ao contraditório, princípio basilar do nosso direito, relativamente aos visados no relatório, enquanto se aguarda para breve, segundo a Sra. Presidente, o envio pelo Tribunal de Contas do relatório final da investigação às contas do município».
Os socialistas silvenses acusam ainda a presidente Rosa Palma de não conhecer as competências de um executivo autárquico permanente, já que é uma «obrigação» de quem «por direito solicitou» a auditoria externa e «durante mais de seis meses manteve fechado [o relatório] na gaveta à espera de melhor oportunidade» remeter tais documentos ao Tribunal de Contas e à Assembleia Municipal de Silves, não precisando, por isso, a autarca comunista de ser mandatada por toda a vereação para tal.
O mesmo se passa em relação à «avaliação da tempestividade para instaurar uma ação de responsabilidade civil extracontratual contra eleitos locais de anteriores executivos», ou seja, à questão de saber se este é o tempo para avançar com tal ação. O PS interroga: «a Sra. Presidente precisa ser mandatada para avaliar situações que possam vir a desencadear ações judiciais junto do Ministério Público? Então o que anda aqui a fazer?».
O comunicado da Concelhia do PS/Silves lança ainda suspeitas sobre a própria auditoria externa, revelando que esta foi encomendada pelo executivo permanente, «por ajuste direto em finais de 2013, à empresa Pocalentejo – Apoio Contabilístico, Fiscal, Informático e Formação Lda., com sede em Borba, e que trabalha quase exclusivamente para autarquias CDU», a mesma cor política do executivo permanente de Silves.
Essa adjudicação terá sido feita em Dezembro de 2013 por 25 mil euros (mais IVA), mas tal adjudicação, «assim como o procedimento concursal, caderno de encargos e contrato celebrado só foi comunicado ao executivo não permanente em 16/9/2015, no seguimento de questões colocadas quando da discussão do relatório».
Por outro lado, referem os socialistas, «o relatório presente em reunião de Câmara e agora publicado no site da autarquia é apresentado como tendo sido elaborado pela empresa G. Marques – SROC,Lda. [e datado de Fevereiro de 2015], com sede na Marinha Grande, sem nunca ser feita qualquer referência à Pocalentejo, empresa contratada para realizar a referida auditoria».
Rosa Palma: contratação da empresa “Viga D´Ouro” sofreu de «irregularidades», que «provocaram prejuízos ao erário público municipal num valor mínimo de quatro milhões de euros, que o Município de Silves se vê agora constrangido a pagar»
Quanto ao relatório da auditoria, a Câmara de Silves resume que a contratação da empresa “Viga D´Ouro” sofreu de «irregularidades», que «provocaram prejuízos ao erário público municipal num valor mínimo de quatro milhões de euros, que o Município de Silves se vê agora constrangido a pagar». Essas alegadas irregularidades «teriam sido praticadas com o conhecimento da Presidente da Câmara Municipal de Silves da altura», ou seja, Isabel Soares.
Os auditores externos também verificaram que, entre 2006 e outubro de 2013, «foi gasto pela autarquia silvense mais de um milhão de euros na contratação da firma de advogados “PLMJ”, sem que a exigência legal de cabimento e de assunção prévia de compromisso financeiro fosse, por norma, garantida, implicando a ilegalidade de grande parte dos pagamentos efetuados pelos responsáveis autárquicos da altura».
Através da realização da auditora externa, foi ainda possível constatar que, no final do mandato anterior (2009/2013), «as contas municipais apresentavam omissões de valor relevante no lado da despesa e dos compromissos financeiros assumidos, estando agora o Município de Silves confrontado com uma forte pressão financeira, já que mais de 70% da dívida da autarquia terá de ser liquidada até 2017, designadamente as dívidas provenientes do processo “Viga D´Ouro”».
O PS, que nesta, como noutras questões, tem surgido sempre aliado ao PSD no executivo municipal, por seu lado, sublinha a necessidade de que «sejam apuradas responsabilidades, se tais responsabilidades existirem». E diz que é preciso esperar, com tranquilidade, a decisão do Tribunal de Contas, que estará para breve.
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