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CCDRA_30 anos fundos_presidentes_26«Façam um grupo de reflexão, juntem-se, esqueçam as divisões partidárias e ponham o Algarve acima de tudo, porque há uma reflexão a fazer sobre o futuro». As palavras são de Luís Valente de Oliveira, ex-ministro do Planeamento nos anos 80 e conhecido como o pai das Comissões de Coordenação Regional.

Aquele antigo membro do Governo falava na sessão comemorativa dos 30 anos da aplicação de fundos europeus na região algarvia, que ontem de manhã teve lugar na sede da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve, em Faro.

A sessão contou ainda com a presença de todos os antigos presidentes da CCDRA: David Assoreira (1980 a 1996), João Guerreiro (1996 a 2003), José Campos Correia (2003 a 2007), João Faria (2007 a 2011) e ainda David Santos (desde 2012).

Como diria, a fechar as intervenções, o ex-ministro Valente de Oliveira, «a sessão foi muito mais do que comemorativa, foi de balanço e reflexão sobre o futuro».

O antigo governante, que conhece bem a realidade algarvia e acompanhou de perto o início da atividade da então CCR e a aplicação dos fundos europeus, fez questão de sublinhar «a dedicação imensa do pessoal desta casa [a CCDRA] e a dedicação imensa à sua terra dos autarcas algarvios».

Mas as intervenções dos antigos presidentes começaram por ordem cronológica, tendo falado em primeiro lugar David Assoreira, que foi o dirigente que mais tempo esteve à frente da CCDR, num total de 16 anos, tendo enfrentado as dificuldades, mas também as esperanças, do período pré-adesão à então CEE (Comunidade Económica Europeia)  e dos primeiros anos após a entrada de Portugal.

 

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David Assoreira recordou que o início do trabalho da Comissão de Coordenação Regional coincidiu com a necessidade de criar a Comissão de Saneamento Básico do Algarve. Perante um «cenário de pré catástrofe» no que à falta de esgotos e até de água potável dizia respeito e que causou, nos anos de 1980, sérios problemas de saúde entre turistas, colocando a região, por más razões, nas primeiras páginas dos jornais ingleses e alemães, foi preciso investir fortemente nesse setor.

Durante a presidência de Assoreira, no âmbito dos projetos de pré-adesão, foram criados os Gabinetes de Apoio Técnico (GAT) de Faro, Tavira e Silves, foi construída a Ponte Internacional do Guadiana, «para resolver um problema sério de acessibilidade», deu-se início aos projetos transfronteiriços entre Algarve e Andaluzia, foi criado o Sistema de Informação Geográfica e o Programa Corinne, fundamentais para dar sustentabilidade ao ordenamento do território, foi implementado o primeiro Programa Regional de Ordenamento do Território do Algarve, o famoso e controverso Protal.

«Foi um esforço que permitiu erguer um projeto que sempre teve opositores e alguns de peso», admitiu David Assoreira.

Sobre esta época, o ex-ministro do Planeamento Valente de Oliveira viria a recordar, no final da sessão, que na altura se corria o risco de «ver resvalar o Algarve para uma Costa do Sol espanhola», sendo isso que se tentou impedir. «Havia muitas pressões», foi preciso ser «muito tenaz, correndo o risco da incompreensão»», recordou o antigo governante.

A presidência de David Assoreira foi, por tudo isso, também um exercício de coragem, como, aliás, a dos restantes presidentes da CCDRA, no sentido em que tiveram de resistir a muitas pressões, vindas de todos os setores.

«Uma vez, vim cá para mostrar apoio ao presidente [da CCR] e visitámos as obras embargadas», lembrou ainda Valente de Oliveira. Uma delas era um hotel construído perpendicularmente a uma linha de água. «Perguntei ao promotor se aquilo era um hotel ou uma barragem», mas ele nem terá percebido a questão, ilustrou.

A concluir a sua intervenção, o primeiro presidente da Comissão de Coordenação salientou que «o Algarve progrediu muito, está melhor, mas há necessidade permanente de muita atenção, para não descambar e não permitir a regressão».

João Guerreiro, que foi o segundo presidente, entre 1996 e 2003, lembrou os tempos em que a CCR «superava um pouco a inexistência de um poder regional», recordou ter trabalhado com quatro ministros, dos quais salientou dois, de governos e partidos diferentes: João Cravinho e Isaltino Morais.

Como projeto mais emblemático, João Guerreiro evocou a «instalação de Bibliotecas Municipais em todos os concelhos do Algarve». E falou ainda do esforço feito no ordenamento do território, tendo o Algarve sido «a primeira região do país toda coberta com PDMs».

 

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Outras questões importantes que avançaram  na sua presidência foi a então inovadora contratualização com as autarquias de parte da execução do PO regional, «levando à criação de um corpo técnico na AMAL», o lançamento da rede das Baixas Densidades, com investimentos em 10 aldeias do interior, a criação dos projetos estruturantes (Vilamoura, Vale de Lobo e Verdelago), em cuja sequência surgiu o PIPITAL, um instrumento financeiro com flexibilidade para pagar projetos regionais, «que muito incomodou Lisboa», e ainda a aposta na inovação, no âmbito da qual surgiu o CRIA, «estrutura de interface entre a investigação, a administração e a inovação empresarial».

Depois de três décadas de aplicação de fundos europeus no Algarve, João Guerreiro apontou também o dedo àquilo que falhou, na região: «faltou a valorização da ferrovia e a implementação de uma rede de ciclovias», o que o ex-presidente considerou mesmo uma «falha injustificada». Mas, concluiu, «falta também maior dinamismo da sociedade nas áreas empresariais, na inovação e na investigação».

José Campos Correia, o terceiro presidente da CCDRA (2003 a 2007), começou por falar dos tempos de «grande dinâmica política» que viveu, com três governos em quatro anos, tendo como primeiros ministros Durão Barroso, Santana Lopes e José Sócrates. «Ministros foram muitos mais!».

E recordou o facto de ele ser, dos cinco presidentes, o único que até agora foi eleito. «Hoje fala-se novamente da eleição do presidente da CCDR», mas, em 2003, esse processo eleitoral aconteceu mesmo, considerando Campos Correia que se tratou de «uma solução feliz e adequada, pelo menos para o Algarve», com a indicação de três nomes pelo Conselho Regional, um organismo com larga representatividade de entidades da região.

O antigo dirigente da CCDR salientou a maior «legitimidade de um cargo com esta responsabilidade» garantida por um processo eleitoral, frisando que «a legitimidade mais alargada é confortável». No entanto, evocou, quando entrou o governo de José Sócrates a escolha do presidente das CCDR voltou a ser feita por nomeação.

Mas a sucessão de governos e de ministros não foi o único problema que José Campos Correia encontrou: «apanhei o phasing out em cheio». «Antes o Algarve tinha envelopes muito confortáveis para investir», depois «fomos penalizados», ficando num «limbo» de uma região que «é suficientemente rica para receber menos e não recebe o suficiente para sair desse limbo».

Correia de Campos disse que o período em que dirigiu a CCDR foi aquele em que se iniciou a fase do «menos betão e mais conhecimento», com o QCA3, a preparação do QREN e do PO Algarve21, e a revisão do Protal, que na realidade deu origem a um «novo Protalgarve».

 

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Nas três décadas de fundos europeus, Campos Correia considera que «mudámos radicalmente», mas «nos últimos 10 ou 15 anos o crescimento é anémico». «Falta aqui qualquer coisa, que também não sei dizer o que é. Mas a União Europeia tem que encontrar novas formas».

João Faria, que foi presidente da CCDR de 2007 a 2011, começou por falar «das áreas que me deixaram algumas perplexidades», como o Ordenamento e o Ambiente.

E referiu os «amargos de boca»: «depois de tudo isto porque é que não convergimos tanto como devíamos? E o problema não é só do Algarve é de todo o país. Como é que se passou do bom aluno à intervenção» da Troika?

Para tentar explicar o que aconteceu, João Faria falou da «dolorosa persistência de algumas debilidades estruturais do país», aquilo a que, citando Vasco Pulido Valente, disse ser: «a História voltou a apanhar-nos».

Quanto ao que o preocupa, o ex dirigente da CCDRA sublinhou a «fraca sustentabilidade das estruturas públicas, em especial dos Municípios» e ainda, aliás retomando uma preocupação já expressa pelos seus antecessores, «os progressos insuficientes da mobilidade regional». «Não é possível termos uma bacia de emprego competitiva com transportes em automóvel, em 120 quilómetros», frisou.

João Faria demonstrou ainda preocupação em relação a outras fragilidades do Algarve. «É preciso perceber que as economias turísticas têm limites ao crescimento de produtividade. Ninguém tira um mestrado para servir coquetéis ao balcão. É preciso criar entidades [noutros setores económicos] que tenham capacidade para pagar salários mais elevados ou não saímos da cepa torta».

CCDRA_30 anos fundos_presidentes_21Para o futuro, fez votos para que seja possível o «aumento do emprego sustentável em setores capazes de suportar salários decentes», nomeadamente definindo «objetivos realistas». «Sabendo que o turismo é insubstituível no Algarve, mas tem limitações, deve-se associar a ele outros setores que sejam puxados pelo turismo», defendeu.

Finalmente, falou David Santos, o atual presidente da CCDRA, que já sabe que está prestes a sair do cargo, depois de o ministério do Planeamento e das Infraestruturas ter anunciado, a 2 de Junho, a sua exoneração do cargo.

Por ser o atual presidente do organismo, fez uma resenha de todos os fundos, montantes e áreas onde foram feitos investimentos financiados pela Europa. E «Como estaremos em 2021 (35 anos)? Atenuámos a sazonalidade? Aumentámos o emprego? Diversificámos a economia? Como estarão as CCDR?», interrogou.

Em relação ao futuro das CCDR, David Santos defendeu que, a haver eleição para o presidente, como parece ser intenção do atual Governo, «a eleição não deve ser só feita pelas autarquias, mas por todos os algarvios». É que, frisou, «a CCDR não tem só incidência na economia municipal», mas em todos os setores da vida da região.

Estas foram as questões que David Santos lançou, para depois terminar a sua intervenção com algumas «notas», bem humoradas. Assim, recordou que a CCDR do Algarve é a que «menos presidentes teve até hoje». «Começou com um engenheiro, depois um doutor, um engenheiro, um doutor e de novo um engenheiro…e diria que o próximo vai ser de novo um doutor», acrescentou, arrancando uma gargalhada à assistência.

Outro dado curioso da CCDR algarvia tem a ver com os nomes dos seus presidentes, que, recordou o atual dirigente, fazem uma «capicua»: «David, João, José, João, David» (ou seja, David Assoreira, João Guerreiro, José Campos Correia, João Faria, David Santos). E mais uma vez a assistência, onde pontuavam autarcas de vários quadrantes políticos, dirigentes de diversas entidades, o reitor e a vice-reitora da Universidade do Algarve, técnicos, empresários e professores universitários, explodiu numa gargalhada. É que, de facto, há coincidências engraçadas na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional.

E, numa cerimónia, que, como salientou João Guerreiro, foi sobretudo «uma sessão de afetos», foi com estas notas bem humoradas que tudo terminou, antes da foto de grupo, à porta do edifício sede da CCDRA.

 

Fotos: Elisabete Rodrigues|Sul Informação

 

 

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